sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

CRONICA DE OPINIÃO DA RÁDIO DIANA/FM


Sexta, 15 Fevereiro 2013 11:24
Nascido a 16 de Abril de 1927 numa família católica da Baviera, na Alemanha, Joseph Ratzinger, o Papa Bento XVI, de 85 anos, anunciou nesta segunda-feira que renuncia à liderança da Igreja Católica por se sentir sem forças para desempenhar o cargo. É preciso remontarmos aos idos de 1400, há quase seis séculos, para podermos conhecer um Papa que tivesse renunciado ao pontificado. Num contexto, de resto, em nada comparável com aquele que hoje se vive: estávamos no tempo do Grande Cisma do Ocidente.
Disse Bento XVI que, depois de ter examinado repetidamente a sua consciência perante Deus, tinha chegado à conclusão de que as suas forças, devido a uma idade avançada, não seriam capazes de um adequado exercício do ministério de Pedro. “Bem consciente da seriedade deste acto, com toda a liberdade declaro que renuncio” – anunciou o Papa, em perfeita conformidade com o Código de Direito Canónico, que, no cânone 332, refere: "Se acontecer que o romano Pontífice renuncie ao cargo, para a validade requer-se que a renúncia seja feita livremente, e devidamente manifestada, mas não que seja aceite por alguém."
Depois da extraordinária mensagem de Ano Novo que Bento XVI proferiu da varanda sobranceira à Praça de São Pedro, em que enalteceu aqueles que em todo o mundo se dedicam a promover a concórdia, muitas vezes longe dos olhares públicos, incansavelmente e sem reconhecimento, armados “apenas com as armas da oração e do perdão” e em que reconheceu que 2013 começou com heranças pesadas, como a recessão que ameaça a Europa, sobretudo a católica do Sul, ou a guerra que devasta a Síria, conflito que em menos de dois anos terá causado perto de 50 mil mortos, abeirando o país da ruína e ameaçando a estabilidade de todo o Médio Oriente, e que, a par dos fanatismos religiosos, do terrorismo e da criminalidade internacional, exigem um renovado empenho na busca do bem comum, Bento XVI dedicou especial atenção aos “focos de tensão e conflito causados por crescentes desigualdades entre ricos e pobres, pelo predomínio duma mentalidade egoísta e individualista que se exprime inclusivamente por um capitalismo financeiro desregrado”.
Num momento em que a Europa debate formas para ultrapassar a crise, o Sumo Pontífice denunciou “as ideologias do liberalismo radical e da tecnocracia” que insinuam “que o crescimento económico se deve conseguir mesmo à custa da erosão da função social do Estado, […] bem como dos direitos e deveres sociais”. Considerando mesmo que “o direito ao trabalho é um dos mais ameaçados”, Bento XVI pediu, então, novas e ousadas políticas que reconheçam o emprego “como bem fundamental para a pessoa, a família, a sociedade” e não como “uma variável dependente dos mecanismos económicos e financeiros”.
Depois destas e de outras sábias e corajosas palavras, ditas e escritas pelo Papa ao longo do seu pontificado, como as dirigidas ao interior da Igreja e as relativas ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e à legalização do aborto, palavras que o Papa deixa e que não leva, e coragem que, do meu ponto de vista, diz muito sobre o seu pontificado, marcando-o, é natural que, na hora da sua resignação, o tenha feito com a grandeza da sua humildade e tenha dito que, “no mundo actual, sujeito a rápidas transformações e sacudido por questões de grande relevância para a vida da Fé, para governar a barca de S. Pedro e anunciar o Evangelho é necessário também vigor, tanto do corpo como do espírito”.
A partir das 19h de Lisboa do próximo dia 28 de Fevereiro, a Igreja Católica fica em estado de sede vacante, período que começa com a renúncia do Papa, e durante o qual é feita a convocação do conclave, e a eleição do seu sucessor. Até que seja conhecido o nome do futuro Papa, a direcção da Igreja Católica fica sob a responsabilidade do colégio cardinalício ou colégio dos cardeais. Depois de João Paulo II, era difícil que Bento XVI pudesse surpreender positivamente. Conseguiu.
Lisboa, 13 de Fevereiro de 2013.
Martim Borges de Freitas

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