Escrever sobre a carreira de Luchino Visconti não é tarefa
fácil. Foi um homem de muitos interesses artísticos. Desde encenador de óperas
até autor de argumentos que outros filmaram, fez de tudo. Mas foi sobretudo
como realizador de cinema que mais se distinguiu. Começou por adoptar o
neo-realismo como forma de expressão artística: “Ossessione”, de 1943 – acho
que este belíssimo filme nunca foi exibido comercialmente em Portugal, e mais
não é do que a primeira versão de “O carteiro bate sempre duas vezes”. “Rocco e
Seus Irmãos” e “La Terra
Trema ”, são três bons exemplos disso. Nos últimos tempos de
carreira, já doente, afastou-se desse movimento artístico e realizou obras em
que as relações sentimentais entre as principais personagens dos seus filmes se
tornaram conflituosas, doentias mesmo, com aspectos, embora ténues, de
homossexualidade e sadomasoquismo. Dessa fase parece-nos justo destacar os
filmes: “Os Malditos” e “A Morte em Veneza”.
Ele próprio, como homem e cidadão, foi sempre muito complexo
e contraditório. Nascido nos primeiros anos do século XX, no seio de uma
família da alta nobreza italiana, politicamente, começou por apoiar o fascismo
no princípio da década de vinte. Mais tarde, mas ainda antes da 2ª Guerra Mundial,
fez parceria com o partido comunista italiano, participando depois na
resistência à ocupação, pelos alemães, do norte da Itália. Até realizou algumas
obras encomendadas por esse partido (La Terra Trema , por exemplo).
Com uma carreira repleta de êxitos, falaremos hoje de dois
filmes que surgem um tanto desenquadrados do seu estilo habitual. Dois filmes
em que aborda a problemática da criação do moderno Estado Italiano. Dois filmes
de época. Cuja acção se situa no século dezanove. Por volta de 1860.
« Sentimento », realizado em 1954.
« O Leopardo », realizado em 1963.
- título em Portugal: “SENTIMENTO” -
título original: “SENSO”
- realização: Luchino Visconti
- elenco: Alida Valli, Farley Granger, Rina Morelli....
O filme conta a história de uma aristocrata veneziana,
partidária da formação de um estado unificado e de raiz italiana. Deixa-se
enredar numa malha de intrigas e amores com um oficial austríaco, das tropas
que por essa época ocupavam o norte do actual território italiano. As tropas
imperiais Austro-Húngaras, a que esse oficial pertencia, acabariam por ser
derrotadas e expulsas das regiões há séculos ocupadas, graças às acções dos
exércitos do grande impulsionador da independência italiana, Giuseppe
Garibaldi. É um filme de muitas e violentas paixões. Alida Valli, tem uma
extraordinária interpretação no papel da mulher capaz de atraiçoar o ideal
nacionalista italiano, atraiçoar a família, atraiçoar tudo e todos, para no fim
constatar que o homem dos seus amores, afinal, é um fraco e um cobarde. Farley
Granger, que está magnifico no papel de “fraco e cobarde”, não lhe fica atrás
na interpretação.
Luchino Visconti, que sempre carreou para o cinema a vocação
de director de ópera, escolheu a obra de Giuseppe Verdi, “IL TROVATORI”,
colocando-a como música de fundo do filme. Quem tiver ocasião não deve perder
esta obra-prima de um dos grandes mestres do cinema.
- título em Portugal: “O LEOPARDO” -
título original: “IL GATTOPARDO”
- realização: Luchino Visconti
- elenco: Burt Lancaster, Claudia Cardinali, Alain Delon,
Rina Morelli....
Luchino Visconti ganhou com este filme a Palma de Ouro do
festival de cinema de Cannes.
Com muito mérito, aliás.
Nota-se um fascínio do realizador por essa época da história
da Itália. Talvez porque, ele próprio, era descendente de alguns dos
protagonistas do movimento que unificou as pequenas nações e cidades estado que
nessa altura se multiplicavam por toda a península italiana. O “Risorgimento”,
assim ficou conhecido esse movimento, chefiado por Giuseppe Garibaldi, misto de
revolucionário e bandoleiro, deu à Itália a sua dimensão actual, incluindo as
ilhas da Sardenha e da Sicília. Ora é precisamente nesta ilha que tem lugar a
acção deste filme. Com uma duração superior a três horas, filmado em magnífico
technicolor, numa produção italiana/francesa, baseado num romance de Tomasi di
Lampedusa, é um mais completos e
extraordinários filmes de sempre.
Conta a história de um velho e nobre aristocrata da Sicília
que, compreendendo a tempo que tudo no seu mundo estava mudando, pretende casar
um dos seus descendentes com a filha de um dos representantes da sociedade que
estava a emergir com o “Risorgimento”. No fundo, este filme, é uma metáfora da
luta de classes. Não da luta de classes actual. Não da luta de classes entre
trabalho e capital. Nesse tempo, era apenas uma luta de classes entre a nobreza
e a burguesia. Saiu vencedora a burguesia, como se sabe hoje.
Grandes desempenhos de Burt Lancaster e Alain Delon. E da
Cardinali, então no auge da sua beleza.
Rufino Casablanca – Monte do Meio – Maio de 1985.
4 comentários:
Tudo está apresentado com conta, peso e medida. Os meus parabéns ao al-tejo.
Obs.
Como somos todos admiradores da musica e do papel mobilizador de G.VERDI podemos aqui lembrar que se trata de um pseudonimo de (apoio) à reunificação italiana:
Viva
Emanuel
Rei de
Italia
M.c.
ANB
Já que a cultura nunca antes conseguida é o que se vê, lá têm que os particulares fazerem alguma coisa.
É uma vergonha,o Alandroal regrediu em quase tudo e na cultura nem se fala é esta a tal cultura nunca vista apregoada aos sete ventos pelo presidente grilo, e depois quem mente fica com alcunhas vítalicias.
Viagens, viagens, viagens.......
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