quinta-feira, 14 de junho de 2012

A SEBENTA – UMA HISTÓRIA CONTADA PELO HELDER


O Parente adoece
 O nosso protagonista começa a sentir-se doente. Sente que respira mal e deixa de trabalhar pensando ser do pó, aquela dificuldade.
Descreve pela última vez, na quinquagésima segunda página da sebenta a sua última ida à festa.
- Vesti o fato e parti para a Vila. Coloquei-me, como sempre nos anos anteriores, à frente da banda, que já não acompanhei. Fiquei para trás e quando ia frente à fonte as forças faltaram-me. Tentei beber água. Mas não consegui subir os degraus. Sentei-me e ali fiquei.
A banda continuava tocando. De repente ouvi uma voz - Parente, o que tens? - tentei responder mas não consegui. Era a Maria do Rossio que passava e ia para a missa. Levou-me a casa e deitou-me. A banda tocava o hino de nossa senhora. Olhei para a santa mas não a vi. Senti que a Maria saiu apressada.
Adormeci.
Passado algum tempo, acordando, ouço o doutor Galhardas dizer à Maria.
- O Parente não pode ficar aqui, sozinho.
- Dão-me um remédio e saem.
Ouvi a Maria soluçar a tornei a adormecer. Acordei com a estrondosa e demasiada salva de foguetes a exaltar a entrada de nossa Senhora para a Igreja Matriz.
Era domingo de Prazeres.
Nessa noite não dormi. Foram horas de reflexão. O doutor a quem eu tinha ofendido viera a minha casa. A Maria do Rossio que antes me rejeitara auxiliava-me agora.
E eu deitado, sem ânimo e sem força.
Que será feito de mim? sem ninguém, sem família?
Acabara de adormecer quando entra a Maria.
 - Parente vais sair daqui. Arranjei-te uma casa, um galinheiro, é alto e tem telhado com forro de madeira, porta com postigo, e um agulheiro que serve para arejar e entrar a luz, agora está tapado.
Está tudo limpinho e caiado.
As filhas das duas últimas Marias, sob a orientação da primeira Maria, renunciando ir ao baile de domingo, arranjaram e assearam o galinheiro.
Quando o Parente está a entrar para a sua nova casa, está a sair a procissão levando nossa Senhora para o Santuário.
Era segunda-feira de Prazeres.
O Parente ouve o hino, com lágrimas nos olhos.
Sentiu uma estranha sensação invadir-lhe o cérebro que lhe pareceu ser o prenúncio de ouvir pela última vez o hino de Nossa Senhora, a Santa da sua
única devoção, que agora no estado débil e de carência parecia abandoná-lo.
Um morteiro ecoou na sua casa, como se um tiro de trotil despoleta-se nas profundezas duma das pedreiras de Borba.
O Parente vergou de alto abaixo, sentiu o coração despedaçar-se e levou a mão ao peito.
Teria caído não fora a Maria do Rossio agarrá-lo, abraçando-o.
Sentiu o calor humano acrescido de carinho da Maria, que poderia ter sido sua e que não fora por causa daqueles, cujo o egoísmo lhe inverte o destino, provocando a desgraça nos outros.
Sentiu uma fé diferente do que até então sentira, que se traduzia numa aproximação humana, carinhosa solidária.
O brilho dos olhos do Parente encontrou no olhar Maria estima e compreensão.

“ Esta é a transcrição de um capítulo da SEBENTA – uma história que o Hélder Salgado escreveu e que há pouco tempo aqui colocamos no Al Tejo.
Agora que a mesma já se encontra em arquivo, e porque talvez não tenha merecido a devida atenção, talvez devido à sua extensão, e porque pensamos que ainda há muitos que se interessam em recordar personagens e factos  que foram um marco importante de tempos passados, resolvemos colocá-la na integra ao alto do Al Tejo conjuntamente com a CIDADE DO ENDOVELICO e HISTÓRIAS ALENTEJANAS assim como  no Al Sul onde poderá lê-la na integra clikando :


1 comentário:

Anónimo disse...

Ótimo! hey eu troρecei paгa еѕta escritos!
еnquanto pгocura o locаl рara tгansferêncіaѕ aleatórіas.
οbrigaԁо compartіlhando Vou enviar e-mail ρara meus amigos sоbre isso também.
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