O Carnaval dos feriados
Martim Borges de Freitas
Sexta, 10 Fevereiro 2012 09:55
De que outro assunto haveria eu hoje de falar? Não, não é da pieguice daqueles portugueses que, agarrados às velhas tradições, não querem evidentemente lutar para vencer esta crise. Não. Hoje, só poderia falar desse assunto maior que é o dos feriados. Como se não bastassem os quatro feriados que o governo quer abolir, acrescentou-lhe o Senhor Primeiro-ministro, com o apoio do governo e dos dois partidos da coligação, o fim da tolerância de ponto da terça-feira de Carnaval. Nem sequer sei se esta abolição também será definitiva ou apenas provisória. Mas, como dizia um amigo meu, sabendo nós que a forma de tornar qualquer coisa definitiva é anunciá-la como provisória e constatando que o governo, de medida provisória em medida provisória, de medida temporária em medida temporária, as vai tornando definitivas, não me admiraria, pois, que a decisão viesse a ter carácter definitivo.
Mas, vamos aos feriados. Tem Portugal feriados a mais, em termos comparativos, com os países europeus? Pelas informações de que disponho, por exemplo, a Alemanha tem 17, a Inglaterra tem 18 e a Áustria tem 15. Portugal tem 14. Que eu saiba, nenhum daqueles três países tem problemas de competitividade ou de produtividade. Não sei se a minha fonte é absolutamente rigorosa. Parece-me é que, sem sabermos como nos comparamos, de pouco servirá argumentarmos naquela linha.
Questão diferente é o hábito das pontes. Aqui é que o argumento da produtividade e da competitividade poderá fazer sentido, já que as pontes significam dias que não são feriados, mas em que não se trabalha e, portanto, não se produz. Aqui sim, sem nenhuma razão justificável. A eliminação das pontes, deslocando o dia de descanso – não obrigatoriamente o da comemoração - para a segunda-feira ou sexta-feira mais próxima, como se faz nalguns países, poderia ser a resposta adequada. E, depois, correndo o risco de poder vir a ser acusado de fazer parte daqueles piegas que estão agarrados às mais velhas tradições, a verdade é que cada feriado, diga-se lá o que se disser, tem uma longa tradição.
Até poderia perceber que o governo, ao querer abolir feriados, quisesse sinalizar a necessidade de, os portugueses, trabalharem mais para que o país possa, no seu todo, produzir mais. Até acho que foi esta a ideia. Mas a forma como o governo e o Primeiro-ministro abordaram o assunto é que foi muito má, reveladora até de um lado do Primeiro-ministro que eu desconhecia por completo. O resultado, esse, é que foi o contrário do pretendido. De facto, começa a notar-se que o Primeiro-ministro não está a conseguir mobilizar os portugueses para a gigantesca tarefa que temos pela frente. Sabendo que é muito difícil fazê-lo, pior será se, em vez de ser transmitida confiança nos portugueses e aos portugueses, em vez de ser conferida previsibilidade às decisões do governo e em vez de ser oferecida segurança às pessoas e instituições, o governo começar a atacar os cidadãos e a transmitir-lhes insegurança e imprevisibilidade - aos cidadãos e às instituições. De resto, olhar as tradições, as velhas tradições, como coisa negativa, do meu ponto de vista nem abona a favor de quem o faz nem apazigua ninguém. Mesmo que o Carnaval cause assim tanto embaraço, não é a dias do dito que se anuncia o fim da tolerância de ponto para a terça-feira de Carnaval. A menos, perversidade das perversidades, que a intenção fosse tentar acabar com o debate que se está produzir na sociedade portuguesa quanto à abolição dos outros quatro feriados …!
E quanto a contas, não basta dividir o valor do PIB pelo número de dias de trabalho, para se saber quanto é que Portugal deixaria de produzir na segunda e na terça-feira de Carnaval. Aliás, contas feitas, contas feitas, está bom de ver quem, neste Carnaval do ano de 2012, vai ser o bombo da festa. Teria bastado uma pitada de bom senso e alguma coordenação política para que todo este carnaval tivesse sido evitado. E todos os objectivos conseguidos.
Lisboa, 9 de Fevereiro de 2012
Martim Borges de Freitas

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