terça-feira, 18 de outubro de 2011

CRÓNICA DE OPINIÃO DA RÁDIO DIANA FM

«Quem cala, consente»
Cláudia Sousa Pereira


Terça, 18 Outubro 2011 09:12
Comecei esta crónica no dia a seguir à divulgação do OE para 2012 e acabo-a depois das manifestações dos Indignados. Mas arrisco a dá-la a ouvir, ainda assim, com este ritmo de dois tempos.
Com as austeridades anunciadas já começaram a surgir entre os meus conhecidos aquilo que previ: declarações de não voto neste governo PSD/CDS nas últimas eleições. Lá fico outra vez com a sensação, como na última maioria absoluta em eleições legislativas do Professor Cavaco, de que vieram os votos ali de Badajoz. Já que o chumbo do PEC IV, que levou à queda do anterior governo e à eleição mais que previsível deste governo e teve o alto patrocínio do BE e do PCP, também assisto incrédula aos que, depois de terem cavalgado a onda desse chumbo e do movimento anti-Sócrates, me vêm dizer que, ou nem sequer foram votar, ou não votaram em nenhum partido, ou pelo menos em nenhum partido com representação na Assembleia da República. Esta forma de não participação, e que exclui a terceira opção dos eleitores, ou de participação muda, leva-me ao aforismo popular «Quem cala, consente».
Alegarão os praticantes da modalidade que estão no seu direito e que foi uma forma de protesto. Não contesto, mas desconfio da sua eficácia. Acho até uma desculpa manhosa para se porem sempre de fora do sistema democrático na sua totalidade, utilizando apenas o instrumento do protesto em forma de desabafo e de contestação, em concentrações, desfiles, abaixo-assinados, e “manifs”, ou nas redes sociais, todas elas obviamente legítimas num estado democrático. Devo aliás esclarecer que em idade adulta participei activamente em três tipos de manifestações: no apoio à causa timorense; naquela em que a palavra de ordem era «Durão, Bush e Blair esta guerra ninguém quer!»; e numa série de comícios de campanha eleitoral, ao lado de propostas políticas que julgo melhor defenderem a Democracia, o Estado, o País e as Pessoas.
Dir-me-ão, também, que poderia usar e juntar a minha voz às recentes manifestações de indignados por várias razões, todas elas decorrentes de uma generalizada crise financeira e que veio pôr a nu opções políticas tomadas num passado não tão recente como isso. Mas acho este tipo de manifestação, ainda que representando escapes na tensão em que obviamente os cidadãos se encontram, pouco eficaz. Como o foi, aliás, a primeira indignação, tão participada, na Av. da Liberdade em Março deste ano, e que afinal não teve mais do que o efeito de dar conforto à oposição do governo de então para o derrubar e acabarmos naquilo que temos hoje, e que desconfio que ainda seja só um começo. Aliás, tendo sido a deste sábado menos participada, ainda que pulverizada por outras cidades, suponho que aqueles que tiveram o tal objectivo em Março já não tenham tido necessidade de se envolver agora nesta.
Também não confundo estas manifestações com outro tipo de assembleias populares, onde aquilo que se discute, decide e se faz mesmo, em associações e estruturas mais fechadas, saia à praça pública, de forma afectiva, para dar a conhecer à restante população, mais distante, os seus problemas e encontrar soluções comuns.
As manifestações têm de ter objectivos muito concretos, concordemos ou não com eles. Aproveitar uma eventual multidão para desatar a disparar em alvos vários, às vezes em movimento, é a meu ver desperdiçar, vá lá, munições, apesar de me desagradar esta imagem bélica. Mas também me parece que é muito mais perigoso organizar estas manifestações de maior precisão. É preciso dar a conhecer todos os contornos daquilo que se contesta e propor alternativas no caminho da solução. Quando tanto se fala da participação dos cidadãos e da cidadania activa, parece-me que esta deve começar a ter contornos mais condignos com o direito à informação de que todos dispomos democraticamente. O problema é que, mesmo quando se tenta informar há sempre quem insista na desinformação, mascarada de informação ou opinião, ou lá o que se lhe queira chamar, com medo de criar silêncios que possam parecer consentimentos e optando pelo tanto barulho que ninguém ouve nada. E é por isso que tantas vezes quando me calo eu não consinto, só não me apetece é ficar a falar para o boneco. E é também por isso que votar me parece a melhor voz que o Povo tem para mais ordenar.
Até para a semana.
Cláudia Sousa Pereira

Sem comentários: