sexta-feira, 5 de novembro de 2010

CRÓNICA DE OPINIAO - RÁDIO DIANA FM

Martim Borges de Freitas - Administração Pudica


Sexta, 05 Novembro 2010 10:36
Já por diversas vezes fui tentado a abordar aqui o tema da Administração Pública portuguesa. Tendo lido uma afirmação do Senhor Secretário de Estado da Energia, Carlos Zorrinho, relativa precisamente à Administração Pública, decidi que seria hoje que falaria uma primeira vez sobre o assunto.
Disse o Senhor Secretário de Estado da Energia, esta semana, que a Administração Pública é o sector que menos tem contribuído para o cumprimento dos objectivos de eficiência energética. Citando-o, disse ele: "há uma coisa com que não nos conformamos. Estamos a atingir os objectivos de eficiência energética em termos globais, mas quem menos tem contribuído tem sido a Administração Pública."
Não vou discutir se Carlos Zorrinho tem ou não razão sobre a questão de fundo. O patamar em que quero abordar o tema, é outro: é o da necessidade de uma Administração Pública e o da aposta na Administração Pública. Por conseguinte, o limite da discussão até onde poderei ir é o da consequência de uma afirmação daquele tipo, que encerra um sentido pejorativo relativamente à Administração Pública portuguesa, a toda a Administração Pública portuguesa. Por ter sido proferida por um governante, sedimenta a percepção que a sociedade já criou sobre a Administração Pública e mina o sentimento que a sociedade vai criando sobre a sua mesma.
Não sendo funcionário público nem de esquerda, sou, como se vê, claramente favorável à existência de uma Administração Pública que, em regra, é a verdadeira memória viva de um Estado. Mais pequena, muito mais pequena, altamente qualificada e, portanto, bem paga, dir-se-á que a Administração Pública que estou a defender, todos defendem. Talvez seja verdade. Mas, os que tiveram poder para o fazer, não o fizeram. E sobre estes, os que, podendo, não o fizeram, o que se pode pedir agora é que se abstenham de a criticar. Aos outros, o que é exigível é que clarifiquem posições, incluindo nessa clarificação o caminho a percorrer e o grau de prioridade que à tarefa querem conferir.
E não deve ser a questão do número de funcionários públicos a que deverá imperar. A este respeito, de nada servirá colocar num qualquer programa eleitoral que se vai reduzir o número de funcionários públicos numa qualquer cifra. Por um lado, porque isso daria a ideia de que só os que lá estão é que lá iriam ficar - o que, além do mais, é sempre mentira. Por outro lado, porque em tempo de crise, de recessão ou, pior, de depressão, fazer semelhante promessa revelaria uma insensibilidade social atroz.
A meu ver, só será possível reduzir drasticamente a Administração Pública portuguesa, quando estiverem reunidas, pelo menos, duas condições: uma, a de poderem ser eliminados todos os órgãos, organismos, contratos, parcerias e outros instrumentos que duplicam ou triplicam funções já atribuídas, com vantagem, à Administração Pública. A segunda condição, é a de que Portugal se encontre em fase de franco crescimento económico, pois, só assim será possível chegar a acordo com os funcionários públicos excedentários, pagando-lhes indemnizações compatíveis, e tendo, ao mesmo tempo, o mercado a oferecer-lhes emprego.
Não se encontrando Portugal em fase alguma de crescimento económico, o debate, aliás prévio, a fazer, deve ser o do novo desenho da futura Administração Pública portuguesa. Para que se torne altamente eficiente e não apenas para que os ataques que lhe são desferidos saiam de moda. No fundo, no fundo, para que a Administração Pública portuguesa deixe de ter de que se envergonhar.
Martim Borges de Freitas

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