quinta-feira, 12 de agosto de 2010

VIAGEM ALENTEJO / EXTREMADURA. IDA E VOLTA PARTE II

(Continuação do dia anterior)

VIAGEM ALENTEJO / EXTREMADURA. IDA E VOLTA 2ª PARTE
( Ou fragmentos da vida de uma família raiana ).

Uma das primeiras preocupações, assim que chegámos a Badajoz, foi arranjar hotel para a dormida, Conseguimos alojamento num hotel barato na zona velha da cidade. Foi aí que o tio Jean Jacques nos foi encontrar após tratar dos assuntos que o levaram a passar a tarde na cidade, e depois de nós termos regressado do nosso passeio Decidiu-se que jantaríamos no restaurante do hotel, afim de nos deitarmos cedo, pois passaríamos a fronteira logo que esta abrisse. ( Por essa época a fronteira do Caia ainda encerrava à meia noite e só reabria ás seis horas da manhã seguinte ) .
Depois de um curto descanso todos nos encaminhámos para o restaurante. Estava repleto. Com alguma dificuldade, conseguimos arranjar uma mesa suficientemente ampla para albergar todo o nosso grupo, num recanto mais afastado, e aí nas instalámos. Quando já íamos a meio da refeição, chegou um casal que se instalou numa mesa ao lado da nossa. O homem era alto, corpulento, e usava um fino bigode. Com grande descontracção, vestia um fato escuro, assertoado, camisa branca a gravata. Pelo contrário, a mulher, mais baixa e franzina, com óculos de aro de tartaruga, de graduação elevada, parecia sentir-se pouco à vontade, e olhava constantemente à sua volta, como que amedrontada.
Falavam em francês.
O tio Jean Jacques, que olhara de relance para os recém chegados, sem lhe dar grande importância, voltou a fixá-los, depois de qualquer pormenor lhe ter chamado a atenção.
Nessa altura todos nós nos apercebemos da perturbação do tio.
O casal instalou-se numa mesa a menos de dois metros da nossa.
Nas costas do tio Jean Jacques.
Nós, como habitualmente, durante a refeição, falávamos em castelhano.
Na mesa ao lado falava-se francês.
A Evita, rindo, ainda brincou com o cosmopolitismo da situação.
O nervosismo do tio era cada vez maior, de tal forma, que a tia Rosário, lhe perguntou se não era melhor que ele nos desse a conhecer as causas da sua perturbação. Em resposta, o tio Jean Jacques, fez sinal para baixarmos o tom de voz. Todos nos calámos. E então assistimos a uma cena que julgávamos impossível : O tio, de costas para a mesa, ouvia a conversa do casal que nela estava instalado. Dominando perfeitamente o idioma francês, não lhe foi difícil seguir a conversação que ali se travava, tanto mais que a mulher falava num tom de voz elevado, dando a impressão que o homem teria algumas dificuldades auditivas. Como a excitação do marido não cessava de aumentar, à medida que ia ouvindo a conversa dos outros dois, a tia Rosário, já agastada, e vendo que não eram dadas explicações plausíveis para aquela situação, mandou que nós, eu e a Evita, terminasse-mos a refeição rapidamente e levou-nos para o quarto, dizendo que ali ficaríamos à espera dos homens. De facto, tanto o meu pai como o tio Francisco, habituados a situações fora do comum, tinham cessado de conversar para darem oportunidade ao cunhado de ouvir aquilo que tanto o estava perturbando.
Os homens só voltaram cerca de uma hora depois.
E aquilo que o tio Jean Jacques nos contou era de tal maneira invulgar que a todos deixou pensativos e com dúvidas :
( Quando o casal se sentou na mesa ao lado da deles, o tio Jean Jacques, num segundo olhar, mais atento, tinha reconhecido o general Humberto Delgado, aquele mesmo que em 1958, tinha concorrido ás eleições para a presidência da República de Portugal e que, segundo era voz corrente, as tinha ganho, só não tendo tomado posse porque foi vítima de uma enorme fraude eleitoral.

(Amanhã último capítulo)

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