terça-feira, 19 de maio de 2009

VASCULHAR O PASSADO – POR AUGUSTO MESQUITA – Maio 2009

Nota previa: Pessoa muito conceituada nos meandros literários de Montemor-o-Novo, já com vários livros publicados, versando principalmente a história do passado desta Cidade , Augusto Mesquita, permite-nos mensalmente transcrever os seus artigos publicados na Folha de Montemor.
Porque os temas abordados são muitas vezes comuns não só ao Alandroal como a outras localidades é imperioso lê-los, compará-los com as realidades da nossa terra e ao mesmo tempo recordar o passado.


Habitação Social - Particulares, construíram 74 moradias!

Fomentar a Habitação Social, é em primeiro lugar, pensar nas pessoas, isto é, pensar numa política de valorização da qualidade de vida das populações, que passando muito pela habitação, não acaba nela, pelo contrário, dá início a um processo global, de melhoria da qualidade de vida das pessoas. Esta política, compete ao governo, mas infelizmente, este, quando toma a cadeira do poder, esquece-se das suas responsabilidades, nesta, e noutras matérias…
Ainda sou do tempo, em que a maioria das famílias montemorenses, eram compostas por um elevado agregado, que vivia em casas com uma, ou duas divisões, e uma cozinha. Não dispunham de água canalizada, de electricidade, nem de casa de banho (lavavam-se em alguidares).
A Constituição do Estado Novo, publicada em 1933, afiançou no seu artigo 14.º, n.º 1, que os cidadãos têm direito à constituição de lares independentes, e em condições de salubridade. Uma década depois, a Câmara Municipal de Montemor-o-Novo, mandou construir no espaço, hoje designado por Rua de Moçambique, nove moradias, destinadas a munícipes, que viviam em casas, que não reuniam o mínimo de condições de habitabilidade e de salubridade. Após esta iniciativa, nem o Estado, nem a Câmara Municipal de Montemor-o-Novo, avançaram com mais construções no nosso concelho.
Face ao alheamento do governo central, e da autarquia montemorense, para este problema social, eis que surge um coração bondoso, que mandou construir a expensas suas, o Bairro de Nossa Senhora da Conceição, que conta com 10 habitações. Foi a primeira, de várias iniciativas particulares, nesta área.
A primeira pessoa que aqui principiou a resolver o grave problema da habitação, foi uma Senhora distinta e virtuosa, a quem já em 1950, a Santa Sé, distinguiu, e honrou com a medalha de benemerência, “Pró Eclusas et Pontífice”, em razão da sua generosa preocupação de bem fazer – a Exma. Senhora D. Eufrásia Margarida Nunes Mexia da Costa Praça. Por sua pessoal iniciativa, e a expensas suas, foi construído o Bairro de Nossa Senhora da Conceição, inaugurado em 8 de Maio de 1955. São dez casas espaçosas e arejadas, dispondo cada uma de três quartos, cozinha, que é suficientemente grande para reunir toda a família, servindo também de casa de jantar, uma dispensa e casa de banho. Todas as moradias dispõem de água, esgotos, e luz eléctrica.
A selecção das famílias, contempladas com as novas moradias, coube à Assistente Social, D. Maria Rosa Sampaio de Carvalho. Houve o cuidado de atender ao número de filhos (mínimo de cinco), e ao relativamente bom nível de moralidade, além da necessidade económica, junta com a grande deficiência das habitações que ocupassem.
O vistoso Bairro foi oferecido pela grande benemérita, ao “Património dos Pobres” – organização social de assistência, cujo fundador, foi o conhecido Padre Américo, das Casas do Gaiato.
Por motivo imprevisto, não pôde vir até nós o Senhor Padre Américo, o que a todos bastante penalizou. Apareceu-nos porém, inesperadamente, o Senhor Padre Adriano, verdadeiro braço direito do Padre Américo. Depois de observar as casas deste Bairro, manifestou a sua alegria, não apenas pelas casas em si, que são muito boas, mas, ainda, pelo facto curioso, de ser este o primeiro Bairro dos Pobres, no País, que possui luz eléctrica, água e esgotos.
Em Altar levantado no meio do Bairro, seguiu-se a celebração da Missa, pelo Senhor Cónego Silva – Vigário Capitular da Arquidiocese. Após a Missa, o Pároco da freguesia, Senhor Padre Alberto Dias Barbosa, procedeu à solene bênção, de todas as casas individualmente, implorando a protecção de Deus, e a prosperidade para todos os seus moradores.
Finalmente, pelas Senhoras D. Elisiária e D. Maria Florentina Praça, foi entregue a cada chefe de família beneficiada, a chave da respectiva casa, enquanto o Cónego Dr. Silva, entregava um crucifixo, para ser colocado, no principal lugar de cada casa.
Ficaram naquele bairro, dez famílias numerosas, num total de perto de uma centena de pessoas.
Este Bairro ficou integrado no Património dos Pobres. A Fábrica da Igreja, ou Comissão Fabriqueira, que existe em todas as freguesias, sob a presidência do respectivo Pároco, é a entidade legalmente responsável, pela administração das Casas do Património, e pela sua orientação, segundo os estatutos do mesmo património.
Foi o primeiro passo, numa benemérita campanha, de enorme alcance social.
Pouco depois, a benemérita e distinta família Praça Cunhal, mandou construir vinte e cinco moradias, no caminho de Nossa Senhora da Visitação, entregues às respectivas famílias beneficiadas, na véspera do Natal de 1956, pela saudosa Senhora D. Maria Eduarda Praça Cunhal, em propositado ambiente de íntima simplicidade.
A importância do seu custo, mil e quatrocentos contos, aproximadamente, foi oferecido à Santa Casa da Misericórdia, pelo Dr. Alfredo Maria Praça Cunhal, a perpetuar a memória de seu pai, o Dr. Alfredo Augusto Cunhal.
A seguir, mais quatro casas do mesmo género foram construídas. No dia 1 de Setembro de 1958, realizou-se a entrega de quatro novas moradias, integradas no Património dos Pobres, construídas junto á Ermida de S. Pedro da Ribeira, pela Exma. Senhora D. Elisiária Margarida Praça Mexia, e seu marido, o Senhor Dr. João Nunes Mexia.
Quatro anos passados, a ilustre Senhora D. Gabriela Nunes Malta Laboreiro de Villa-Lobos, mandava construir no local, agora designado como Bairro de Nossa Senhora da Visitação, duas belas moradias, logo entregues a famílias carenciadas.
Junto a estas, foi construída pela Liga Independente Católica Portuguesa, mais outra casa para pobres.
Em 1961, o Senhor Dr. Alfredo Maria Praça Cunhal, mandou edificar um Bairro, (hoje conhecido por Bairro Dr. Cunhal), destinado a famílias carenciadas, mediante o pagamento de uma renda mínima, o qual ofereceu à Santa Casa da Misericórdia. O Bairro dispõe de trinta e oito fogos (vinte e quatro de 2 pisos e 14 de 1 piso).
Em 9 de Julho de 1963, reuniu a Mesa da Santa Casa da Misericórdia, em sessão extraordinária, para atribuição das casas do “Bairro Dr. Alfredo Augusto Cunhal”, que como foi referido, foi doado à Misericórdia local, pelo Exmo. Senhor Dr. Alfredo Maria Praça Cunhal. Era condição expressa da doação, que as rendas das casas, que passam a fazer parte do Património da Misericórdia, nunca excedessem, o valor de quatro dias úteis de trabalho, de um operário não especializado, e assim, ficou estabelecido, o valor de 23$00 como salário mínimo, o que por arrendamento, dá rendas mensais de 90$00.
Inscreveram-se como pretendentes a inquilinos, 280 famílias. Assim, depois de realizado o respectivo inquérito social, que se destinava a avaliar as condições económicas, morais e habitacionais dos pretendentes, e depois de, em várias sessões, ter sido apreciado, e devidamente ponderado, cada caso individual, entendeu por voto unânime, a Mesa da Santa Casa da Misericórdia, excluir por vários factores, 108 pedidos. Como se verificasse, que apesar desta prévia selecção, ainda havia 172 famílias, em condições sensivelmente iguais, foi resolvido, atribuir as casas por sorteio, destinando-se um terço do Bairro, para trabalhadores rurais, e dois terços, para as restantes profissões. O sorteio realizou-se sob a presidência da respectiva Autoridade Administrativa. Os pretendentes, beneficiados pelo sorteio, foram devidamente avisados, ficando a Misericórdia, com o direito de os excluir, no caso da não apresentação de fiador, que convenha aos interesses da Santa Casa da Misericórdia. Para esta hipótese, foram sorteados mais catorze pretendentes, como substitutos.
Após a assinatura dos respectivos contratos de arrendamento, os inquilinos, tomaram posse dos imóveis, no dia 1 de Agosto desse ano.
Por vontade expressa do doador, não se fez inauguração solene, nem qualquer acto festivo externo. Apenas se realizou, no dia 31 de Julho, uma missa por alma dos pais, do Exmo. Senhor Dr. Alfredo Maria Praça Cunhal.
Finalmente, no dia 18 de Setembro de 1962, em ambiente simples e privado, realizou-se o acto de entrega, de quatro casas construídas pela Família do falecido Engenheiro, António Justino Mexia da Costa Praça, que em vida, mais de uma vez, manifestou intenção e desejo, de as construir.
Trata-se de quatro esplêndidas moradias, situadas na Rua dos Cavalos, e que ficaram a pertencer ao Abrigo dos Velhos Trabalhadores.
No acto oficial, após a bênção das casas, feita pelo Pároco da freguesia, que pronunciou algumas palavras alusivas, na presença das famílias beneficiadas, foi pela Exma. Senhora D. Eufrásia Costa Praça, descerrado um retrato, do seu comemorado filho, e em seguida, procedeu-se à entrega das chaves, aos respectivos arrendatários.
Estes exemplos, de amor ao próximo, que é justo relatar e homenagear, permitiram, que setenta e quatro famílias montemorenses deixassem as habitações insalubres, e passassem a viver em moradias dignas, com todas as condições de habitabilidade.

Augusto Mesquita

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