segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

PÁGINAS SOLTAS - (PELO DR JOSÉ ALEXANDRE LABOREIRO)

A propósito de um Centenário

«Todo o entendimento começa pela admiração.»

Wolfgang Goeth
(Escritor alemão – 1749/1832)


Catarina Portas, em Crónica no “Público” sobre o escritor francês Henri Pollès, desvenda que o seu grande amor aos livros o levara a confidenciar: “Eu adorava tocar, apalpar, afagar os livros, sempre livros novos, esses veículos de luz, de consciência, de encantamento, e comprava-os até à minha última nota, todos os dias, por vezes até ao meu último bilhete de Metro”. E seria este fascínio do Homem pela Cultura Literária (enquanto repositório de conceitos, de ideias, de conhecimentos, de estética, de teorias, de ideologias) que levaria o jornalista Boavida Portugal a publicar - no jornal “República” - um estudo sobre a exaltação literária, o culto entusiástico à literatura (“O grande público que lê deseja encontrar nos livros o caminho a trilhar” - dizia-nos ele no seu “inquérito literário”, por volta de 1912): isto, ocorrendo no âmbito de um desejo profundo da jovem República aproximar Portugal da Europa culta e desenvolvida (“urgência de Europa”, como Mário de Sá-Carneiro, em carta a Fernando Pessoa, referia esse propósito dos republicanos).
E seria esta linha-de-força dos valores da Democracia, do Desenvolvimento, da Liberdade, da Ética Política, da Aculturação, da formação estética, da Cidadania, da Educação do caracter, que presidiu à vida literária de Trindade Coelho (que, “bebendo” a sua formação política e cultural de feição progressista na academia de Coimbra, durante a sua vida de estudante de Direito, norteara a sua produção jornalística e literária por princípios, transformadores e redentores do País decadente, assentes na aculturação e dignificação do povo - a par de um desenvolvimento económico, como se fazia na Europa desenvolvida).
Viviam-se os anos de governação de Hintze Ribeiro e de João Franco (que, com a apatia do Rei D. Carlos, respondiam ao avanço dos republicanos e dos anarquistas, com perseguições e golpes de ditaduras - em vez de soluções dos caóticos problemas do país). Trindade Coelho, após uma vida de luta pela regeneração da Pátria enquanto tocado pelos ideais patrióticos reavivados particularmente com a reacção intelectual ao humilhante Ultimato Inglês, sente-se traído (à semelhança do grupo “Vencidos da Vida” pelas circunstâncias, pelas calúnias, pelas incompreensões, pelas invejas, pelos oportunismos, pela falta de rasgos políticos, pela visão curta de gente responsável: e, num acto de desespero perante a impotência de enfrentar o caos da vida social, cultural e política do País, suicida-se (1908) - tal como o fizeram (por razões semelhantes) Camilo, Antero, Soares dos Reis, Cândido dos Reis, Mousinho de Albuquerque e Manuel Laranjeira - e que levaria o pensador espanhol Miguel de Unamuno a interrogar-se sobre a situação de Portugal, enquanto “país de suicidas”.Trindade Coelho nascera em Mogadouro (Trás-os-Montes), em 1861 – onde aprende as primeiras letras; frequenta o curso liceal no Porto, e licenciou-se em Direito em Coimbra. Faria as primeiras composições literárias, ainda enquanto liceal, mas seria o seu “mergulho cultural” na academia de Coimbra, que o lançaria - a par do Direito - no Jornalismo e na Literatura: efectivamente, em Coimbra cria a revista cultural “Panorama Contemporâneo” e escreve uma História do Direito Romano. No seu percurso de jurista, ocupa cargos de magistrado no Sabugal, em Portalegre (onde funda dois jornais), em Ovar e fixa-se definitivamente em Lisboa.
Fixado num centro cultural maior colabora nos jornais “Novidades”, “Portugal” e “Repórter”. Funda a “Revista Nova” (de feição cultural) e uma Revista de Direito e Jurisprudência.
Escreve o livro “Os meus Amores” (de contos e baladas), o livro de memórias sobre a vida académica de Coimbra “In illo Tempore”, o livro de Ensaios “Terra Mater”, os livros de pedagogia cívica “Manual Político do Cidadão”, “Cartilha do Povo” e “Parábola dos Sete Vimes” e o livro de contos “O Senhor Sete”.
Num acto de reconhecimento nacional pela Figura literária, jornalística e de intervenção política (perpassada de humanismo e fervor patriótico), que José Francisco Trindade Coelho incarnou, a Câmara Municipal de Mogadouro (em parceria com a Universidade de Coimbra) - a par de outras iniciativas culturais - promoverá exposições itinerantes, conferências e um prémio literário a nível nacional (no intuito de divulgar, publicitar e promover a vida e a obra do Escritor) - assinalando o Centenário da Morte do Pensador Mogadourense.

José Alexandre Laboreiro

Publicado na “FOLHA DE MONTEMOR” e transcrito com autorização do autor. Al Tejo agradece à Folha de Montemor o envio do texto.

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