quinta-feira, 16 de outubro de 2008
CRÓNICA DE OPINIÃO DA RÁDIO DIANA/FM
http://www.dianafm.com/
Eduardo Luciano - O raio da crise
16-out-2008
Parecia mal que, quando toda a gente opina sobre a crise dos mercados financeiros, este pobre cronista de província não tivesse também uma palavra a dizer sobre o assunto. Devo confessar-vos que resisti até onde me foi possível para não abordar tão importante matéria. Não é que não me preocupe com os pobres banqueiros desprotegidos e ameaçados com a miséria iminente, a miséria, seja ela qual for, sempre me preocupou, é porque esta coisa de falar em milhões e milhares de milhões para gente que se vê aflita para conseguir as centenas que lhe permitem continuar a viver debaixo de um tecto, parece-me um bocadinho descabido.
A crise está aí, o pânico instalou-se, o sistema financeiro ameaça ruir como um baralho de cartas e, perante o terramoto anunciado, logo o nosso prestimoso governo decidiu instituir garantias no valor de vinte mil milhões de euros à banca para operações entre bancos sedeados em Portugal. É uma situação gravíssima, era necessário tomar medidas que restabelecessem a confiança dos investidores e impedissem o alastrar do pessimismo que levaria à implosão do sistema. Ou seja, nesta economia de casino todos podem perder dinheiro menos os donos da casa de jogo. Mas porque não acode, da mesma forma célere, o governo às pequenas e grandes crises que se passam nas famílias dos portugueses? Já sei que não chega para tudo, mas algumas medidas poderia o governo tomar para restabelecer a confiança dos portugueses que a única coisa que têm para investir é a mão-de-obra que vendem em troca de um salário. Que diabo, também são investidores. E que tal um programa de emergência que baixe as taxas de juros e que limite o spread, para permitir que os portugueses, que começam a ter dificuldade em pagar as prestações da sua habitação, possam respirar melhor? E que tal um esforço no sentido de aumentar salários e pensões, que promovam uma melhoria das condições de vida dos mais desfavorecidos, dinamizando o consumo interno e estimulando a economia? E que tal umas quantas medidas que aliviem a pressão sobre as micro e pequenas empresas que se encontram em situação muito mais aflitiva que os croupiers do sistema? Já sei que não chega para tudo mas, caramba, tem sempre que faltar aos mesmos? Os banqueiros mais poderosos vieram à televisão agradecer as medidas do governo. A silenciosa Manuela abriu a boca para se colocar ao lado do suposto adversário e o CDS, muleta ora de um, ora de outro, também bateu palmas. Todos do mesmo lado, portanto. Do outro lado ficaram os tais investidores, que só podem investir a mão-de-obra e o único resultado que podem esperar é o pagamento do salário no fim do mês, que se encarregarão de entregar aos pobres banqueiros que o Governo se disponibilizou a ajudar. Há muito tempo que as águas não estavam tão bem separadas. A propósito dos efeitos da crise e a quem aproveita as medidas tão elogiadas, olhemos para as capas dos jornais e revistas que durante a última semana publicaram fotografias de corretores da bolsa, uns dias com ar desesperado, outros com ar de felicidade suprema. Antes e depois da intervenção dos governos. Agora imagine que alguém o ou a fotografou nesses mesmo dias. Acha que se veria a mesma diferença de humor? Claro que não. E sabe porquê. A sua vida, num e noutro momento, esteve sujeita às mesmas dificuldades. Nada melhorou e nada piorou. Mas tenha fé… os mercados (seja lá isso o que for) estão muito mais optimistas.
Até para a semana
Eduardo Luciano
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3 comentários:
Que bem escrito e que grandes verdades.Sobra sempre para os mesmos.
Jose Inacio
Isto é muito mais sério do que parece: se os governantes não apoiassem os patrões eles podiam despedi-los...
Casa com eles se gostas tanto deles ...Lambe botas .
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