quinta-feira, 10 de julho de 2008

CRÓNICA DE OPINIÃO DA RÁDIO DIANA/FM (DUAS)

Transcrição da crónica diária transmitida aos microfones da :http://www.dianafm.com/

Crónica de Hélder Rebocho

09-jul-2008
No plano dos princípios sempre ouvimos dizer que “o crime não compensa” e que “ não há crimes perfeitos”. Seria bom que assim fosse de facto, que todos os crimes deixassem algum sinal, alguma ponta que permitisse aos investigadores encontrar os culpados, de forma a fazer-se justiça. Mas do sonho á realidade vai uma grande distância e ao contrário do que seria ideal há crimes desvendados e outros que nunca o são, a história dá-nos inúmeros exemplos, em Portugal e no Mundo. Vem tudo isto a propósito do mediático caso Maddie, a menina Inglesa que desapareceu de um empreendimento turístico no Algarve em Maio do ano passado e da qual nada mais se conseguiu saber até hoje, não obstante a investigação da PJ, com o auxílio da polícia Inglesa e a intromissão de detectives privados e outros curiosos que foram aventando as mais diversas teses sobre o desaparecimento da criança. Volvido mais de um ano, este caso que mereceu um lugar de destaque nos média e junto da opinião pública, parece aproximar-se do fim, com um provável arquivamento, que não surpreende se considerarmos todos os desenvolvimentos da investigação. O mediatismo que envolveu o caso e lhe conferiu um impacto pouco vulgar em Portugal, poderá ter produzido um efeito perverso. Se estivermos perante um rapto não há dúvidas que o mediatismo funcionará positivamente, mas se o crime que está por detrás do desaparecimento for um homicídio, então o efeito da acção dos média e da opinião pública que lhe está associada, será o inverso, acabando por ter um efeito prejudicial. Seja como for se o caso for arquivado, como tudo parece indicar, isso não significa que existam crimes perfeitos, mas apenas que não existem investigações infalíveis. Com isto não pretendo endereçar qualquer crítica à actuação da P.J., que muito boa conta tem dado de si enquanto órgão de investigação criminal, mas apenas realçar que a acção dos média no âmbito de investigações criminais deverá ser repensada, de forma que a sua importante missão de informar, não exceda os limites daquilo que é o interesse público. Está demonstrado que a investigação jornalística, efectuada dentro de certos parâmetros objectivos, pode ser importante na denúncia e na investigação de certos crimes, mas é importante não esquecer que a comunicação social tem hoje uma função que vai muito para além da mera informação e é notória a sua capacidade de manipulação da opinião pública. Por isso seria importante que certos assuntos fossem tratados, apenas, na perspectiva da informação, ficando de fora dos interesses comerciais e das guerras de audiências. Agora que a investigação parece caminhar para o fim, sem o apuramento do crime e dos seus autores, será mais importante a acção dos média do que o foi na fase de investigação, porque importa não deixar cair o caso no esquecimento, como aconteceu noutras situações semelhantes. Veremos até que ponto se confirma a máxima economicista segundo a qual um assunto só interessa quando vende.

Ir à Bruxa

10-jul-2008
Recebi no meu endereço de e-mail, uma mensagem assinada pelo Director Artístico da “A Bruxa Teatro”, alertando para a grave situação em que aquela companhia se encontra. A Bruxa iniciou a sua actividade em 2001, sendo financiada pontualmente pelo Ministério da Cultura e desde a sua fundação em exclusividade ou em parceria com outras instituições, pelo Município de Évora. Como é fácil de perceber, foram sete anos de enormes dificuldades financeiras, mas também de um inestimável serviço prestado à cidade, que valeu o empenhamento de muitos actores, cenógrafos, artistas plásticos, escultores, fotógrafos e outros colaboradores das mais diversas áreas. Toda esta actividade, cerca de duas dezenas de produções, teve como local de realização, por cedência do Município, as instalações dos ex-celeiros da EPAC, que, reconhecidamente, não tem as condições mínimas para a função que lhe foi atribuída.
Talvez por denúncia, talvez por operação de rotina, as instalações da Bruxa foram visitadas pela Inspecção-Geral das Actividades Culturais, que concluíram o óbvio: o espaço, pelo seu estado de degradação, não pode servir como sala de espectáculos. Para além da aplicação de coimas de elevado valor, a Bruxa Teatro corre o risco de ser intimada a encerrar aquele espaço, ficando sem alternativa viável para a produção e exibição das suas peças. Conta-se no e-mail enviado, que tendo sido dado conhecimento da situação a um alto responsável pelo Departamento Cultural do Município eborense, este terá tecido considerações do nível: “ninguém vos pediu que existissem”, “ a Câmara não precisa da Bruxa Teatro para nada”, “se calhar, nunca deviam ter existido, porque a cidade não comporta duas companhias de teatro”, “ se a Bruxa fechar, fecha!”. Perante uma situação de aflição de um agente cultural a resposta dada é, na minha opinião, um claro… desenrasquem-se. Percebe-se. A política cultural que é defendida não passa por apoios a projectos alternativos ao gosto dominante e está bem suportada nas ideias do já famoso estudo de viabilidade da empresa municipal para a gestão dos espaços culturais. Espectáculos que não tenham número suficiente de espectadores que lhes permitam a auto-suficiência, não têm razão de existir. Mas de todos as frases alegadamente ditas pelo tal alto responsável, a que mais me indigna é aquela em que o senhor afirma “a Câmara não precisa da Bruxa Teatro para nada”. Consubstancia uma visão utilitarista e manipuladora dos agentes e criadores culturais, que são usados conforme a estratégia política de quem exerce o poder num determinado momento. De facto, não é a Câmara que precisa da Bruxa ou de qualquer outro agente cultural. É a cidade e as suas gentes que precisam de oferta cultural diversificada, competindo ao município tudo fazer, dentro das suas possibilidades, para que a sobrevivência destes projectos seja menos penosa e para que a sua divulgação ponha mais gente em contacto com outras formas de olhar e de ouvir. A acção da Câmara parece coisa simples. Cumprir o n.º 2 do Artigo 73.º da Constituição da República, tudo fazendo, nesta situação em concreto, para encontrar, com A Bruxa Teatro, as soluções que possam contribuir para a continuação da sua actividade. No Post Scriptum do e-mail pede-se o seu reencaminhamento para outros espectadores e amigos da Bruxa, “livres pensadores que não se submetem à ortodoxia político partidária.” Meu caro Figueira Cid, aqui tem a solidariedade de um livre-pensador que não se submete à ortodoxia dos que entendem que liberdade de pensar é sinónimo de ausência de compromisso político partidário.
Até para a semana.
Eduardo Luciano

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