quinta-feira, 27 de março de 2008

CRÓNICA DE OPINIÃO DA RÁDIO DIANA/FM

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A palavra mágica

27-Mar-2008
Milhões, parece ser a palavra mágica que quando escrita a negro numa folha branca é capaz de esconder todas as outras. Depois de dizer meio milhão falar em quinhentos mil parece ridículo. Toda a gente que trabalha na área da comunicação sabe disto. É por essa razão que quando se anunciam projectos a primeira coisa que se atira aos olhos e ouvidos são os milhões que vão ser gastos. E se for para um objectivo consensual há logo muita gente a concordar e poucos são os que se questionam sobre o que vai ser feito. Como se a palavrinha milhões tivesse o condão de transformar todas as outras em meros adereços para que o texto não pareça pobre. Sabendo isto, foi sem espanto que assisti ao anúncio por parte do Senhor Presidente da Câmara de um investimento de mais de duzentos e cinquenta milhões, em 10 anos de intervenção, no Centro Histórico de Évora.
A base para tal anúncio é um relatório da empresa Park Expo que propõe um conjunto de propostas de intervenção para a recuperação da cidade antiga. É fantástico como depois da completa ausência do tema na recente revisão do PDM, que provocou reacções de desagrado numa das mais concorridas reuniões de discussão pública do documento e que nem constava da agenda inicial de encontros com os cidadãos, o Presidente da Câmara venha agora bater com as notas em cima da mesa e adoptar as propostas do estudo da Park Expo. Não é que o referido estudo não tenha aspectos muito interessantes, que retomam muitas das propostas e perspectivas de intervenção que o município tem vindo a produzir desde que, em 1983, a Câmara apresentou o primeiro programa de intervenção para a recuperação daquilo que todos consideram a jóia da coroa deste território que habitamos e que levou a UNESCO a declará-lo, em 1986, Património da Humanidade. Esta gestão municipal tem, nos últimos 7 anos, contribuído para o acentuar do fenómeno de desertificação deste espaço. Basta recordar a saída de serviços camarários com maior afluência de público para o Parque Industrial e a supressão de lugares de estacionamento dentro e fora das muralhas, como exemplo de iniciativas que tiraram gente a este espaço fundamental. Nos últimos anos a maior parte das obras visíveis realizadas no Centro Histórico limitaram-se a dar continuidade ao que tinha sido lançado em mandatos anteriores. Mas agora a Park Expo aponta o caminho da intervenção para a recuperação e o senhor presidente, depois de todas as decisões políticas que tiveram como consequência o acentuar da diminuição da actividade humana neste espaço, vem anunciar o investimento dos duzentos e cinquenta milhões e agarra a bandeira da sua recuperação. Com milhões ou com tostões, recupere-se. Mas talvez não fosse mau de todo divulgar com mais ênfase as propostas de intervenção, do que o dinheiro que supostamente vai ser gasto. Como todos estamos fartos de saber podem-se gastar muito mal milhões de euros. Até se pode descaracterizar a tentar recuperar. Percebo que em plena pré-campanha eleitoral sejam os anúncios de milhões que dão votos, mas têm de perceber que o pessoal também gosta de ler, perceber e discutir aquelas letras miudinhas onde está escrito o que se pretende fazer.
Até para a semana
Eduardo Luciano

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