quarta-feira, 3 de outubro de 2007

CRÓNICA DE OPINIÃO DA RÁDIO DIANA/FM

Transcrição da crónica diária transmitida aos microfones da :http://www.dianafm.com/

Crónica de Hélder Rebocho

quarta-feira, 03 Outubro 2007
A comunicação social ocupa no mundo actual um papel fundamental enquanto veículo de circulação e transmissão de notícias, factos e acontecimentos.
É, na verdade, um agente de relevante interesse público, enquanto prestador de um serviço de informação, formação e divulgação cultural.
Mas a par destes inegáveis benefícios dos “média” é importante ter consciência que a sua crescente preponderância a nível da sociedade e da opinião pública pode ter consequências perversas, se a missão de informar e esclarecer não for exercida de forma responsável, séria e isenta.
A comprovar isto mesmo temos o exemplo dos muitos tablóides espalhados pelo mundo, que mais do que desinformar deturpam as notícias e moldam-nas á sua maneira, tendo sempre como primeiro objectivo as tiragens e não a elevada missão de informar.
Compreendo que hoje quase tudo é um negócio, sujeito às implacáveis regras da concorrência.
A comunicação social não é excepção. Cada vez mais condicionada pela guerra das audiências vê-se na contingência de implementar e adoptar modelos mercantilistas na gestão da informação, tantas vezes questionáveis.
Na passada semana assistimos a mais um triste episódio desta realidade.
Um canal de informação nacional, daqueles que disputa o top das audiências, convidou o ex-Primeiro Ministro de Portugal, Pedro Santana Lopes para uma entrevista em directo, quando de forma súbita, foi interrompido a meio para transmitir a chegada a Portugal de um treinador de futebol de nome Mourinho.
Perante tamanha desconsideração o entrevistado manifestou com frontalidade o seu legítimo e justificado direito à indignação e abandonou o estúdio.
Não posso deixar de aplaudir a sua atitude exemplar, como aliás o fizeram quase todos os analistas e muitos Portugueses de bom senso.
Estranho é o facto de o referido canal televisivo não ter reconhecido o seu erro, a menos que considere que não errou.
Chegados a este ponto e perante tamanho despautério, parece-me que é urgente ponderar o rumo que este país está a tomar.
Interromper uma entrevista em directo, seja de quem for, para exibir imagens da chegada de um treinador de futebol ao aeroporto, só é possível num Portugal subjugado à ditadura do futebol, onde todos conhecem os Mourinhos, Figos e companhia, mas muitos não sabem quem foi Camões, nem sequer o que foi o 25 de Abril, isto para não falar naqueles que não exercem o direito de voto, mas vão religiosamente aos estádios de futebol.
Pessoalmente não tenho nada contra o futebol, mas acho que não se lhe pode dar mais importância do que aquela que efectivamente tem para o povo, enquanto modalidade desportiva com uma função de entretenimento.
É verdade que é também um negócio de milhões, mas esses só aproveitam à restrita casta dos iluminados, constituída por alguns atletas, gestores, empresários e investidores.
Dar tanta relevância às imagens da chegada de um treinador de futebol que é também um desempregado milionário é no mínimo repugnante, não só pela desconsideração que representou para o entrevistado, porque a cobertura noticiosa não justificava, nem sequer, a interrupção da novela da tarde, mas porque falamos de Portugal, onde existem milhares de desempregados a viver abaixo do limiar da pobreza, que perderam os seus postos de trabalho sem receberem a magra indemnização a que teriam direito por anos de trabalho árduo.
É esta a sociedade em que vivemos, onde cada vez mais alguns “média”, sobretudo canais televisivos e revistas cor de rosa, se assumem como “fazedores de heróis”, sejam eles treinadores de futebol, futebolistas, fúteis “socialités”, actores de novelas, apresentadores de programas de qualidade duvidosa ou grupos de miúdos fechados numa casa em regime de internato a viverem 24 horas em directo para todo o país.
Haja esperança que as mentalidades mudem e que todos os Portugueses despertem para aquilo que é realmente importante, até lá seguramente continuaremos na cauda da Europa ou numa zona que lhe fica muito próxima.

Hélder Rebocho
03.10.07

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