quinta-feira, 27 de setembro de 2007

CRÓNICAS DE OPINIÃO DA RÁDIO DIANA/FM (DUAS)



Crónica de Hélder Rebocho

quinta-feira, 27 Setembro 2007
O verão que agora findou caracterizou-se pela instabilidade. Não foi só o tempo, menos risonho que o habitual, a tornar atípica esta estação do ano, foi também a copiosa chuva legislativa que nos inundou no mês de Agosto.
De uma assentada foram alterados o Código Penal, o Código de Processo Penal, o Código de Processo Civil, a Lei do Acesso ao Direito e aos Tribunais, entre outros diplomas, que para evitar a exaustão não vou aqui enumerar.
Infelizmente este devir legislativo não é novidade, tem sido assim de há alguns anos a esta parte.
Perante o sentimento generalizado de que a justiça não está bem, opta-se invariavelmente pela proliferação legislativa, com reformas sobre reformas, algumas de efeito prático duvidoso e outras até desastrosas.
Há normas que hoje entram em vigor para serem revogadas poucos meses depois, porque se chega á conclusão que as suas virtudes morrem na passagem do plano teórico à prática judiciária.
A par da insegurança, que as constantes alterações legislativas provocam nos operadores judiciários, aquilo que mais preocupa é não conseguirem resolver os verdadeiros problemas da justiça em Portugal.
Tal estado de coisas só é possível porque quem governa, de duas uma; - Ou pode e não quer resolver esses problemas ou quer resolvê-los mas não pode, porque não tem capacidade.
Existem experiências passadas que comprovam os efeitos do desnorte legislativo, que atestam o seu efeito perverso, porque que ao invés de contribuírem para um melhor funcionamento da justiça, apenas acentuam a sua debilidade.
Há um ano reduziram-se as férias judiciais, tentando fazer crer que eram uma das causas da lentidão da justiça.
Privatizou-se o notariado, que por sinal era lucrativo para o Estado, e com uma mão entregou-se esta actividade aos particulares. Depois do investimento feito pelos notários para instalarem os seus cartórios, o governo com a outra mão retirou-lhe uma série de actos que eram da sua competência, para os atribuir às Conservatórias, entregando-os de novo ao Estado.
Reformou-se a acção executiva e aquele que até era um dos tipos de processo que funcionava bem, deixou de funcionar, existindo hoje Tribunais com centenas de acções executivas, propostas há muito, que nem sequer foram distribuídas.
Em todos estes casos ganhou-se em demagogia, perdeu-se em eficácia, porque não foram devidamente consideradas as sugestões e as propostas de quem realmente conhece os problemas da justiça, ou seja Magistrados, Advogados e Funcionários Judiciais.
O processo legislativo que conduziu á recente reforma da Lei Penal e da Lei Processual Penal foi mais um acto autista do executivo, porque cumprindo a formalidade de ouvir as estruturas representativas das classes ligadas á justiça, virou a cara para o lado ás criticas e sugestões que lhe foram feitas.
Este facto, estranhamente, não causa surpresa, porque na senda de anteriores reformas legislativas o objectivo principal não foi contribuir para a melhoria do funcionamento da justiça, mas antes resolver outros problemas marginais.
O caso da prisão preventiva é flagrante.

O sistema prisional tornou-se num gravíssimo problema, dada a sobrelotação das cadeias, a toxicodependência e a evidente incapacidade ressocializadora da prisão. Em face desta realidade, decidiu-se limitar a aplicabilidade da prisão preventiva.
A estratégia é sempre a mesma, seja no caso dos Tribunais ou das prisões.
Perante a falta de meios materiais e humanos é sempre mais fácil legislar do que investir, ainda que em prejuízo do interesse público, dos cidadãos e da vida em sociedade.
Resta saber até quando e com que consequências se continuará a tentar curar a grave enfermidade da justiça em Portugal com cházinhos de camomila.

Hélder Rebocho
25.09.07

As palavras da moda - Eduardo Luciano

quinta-feira, 27 Setembro 2007
Cada tempo do calendário político tem o seu léxico próprio. Nestes tempos cinzentos em que vivemos, em que nos anunciam todos os dias a morte das ideologias e nos esfregam na cara com os pragmatismos próprios de quem anuncia a superioridade das concertações, dos consensos e dos pequenos objectivos que mudam qualquer coisinha para garantir que o essencial continue na mesma, existem palavras que andam na boca de toda a gente que detém uma qualquer migalha de poder e que são repetidas até perderem o sentido.
Qual de vós não levou já com as famosas “janelas de oportunidade”, com as moderníssimas “parcerias” ou com o cúmulo do caminho para o sucesso que está inscrito na badalada “cultura de exigência”?
Está na hora deste vosso humilde observador do quotidiano se deixar de parvoíces e aderir também à utilização dos termos da moda.
Como sabem deverão estar neste momento em avaliação, as muitas dezenas de propostas de correcção do projecto de revisão do PDM. Mais do que servir para incluir esta ou aquela proposta na versão final do documento, este poderá ser o último momento em que se abre uma “janela de oportunidade” para pegar num documento, que foi várias vezes “atropelado” durante o período de discussão pública, e transformá-lo num instrumento de planeamento que sirva a qualidade de vida das pessoas e defenda o concelho das tentações de modelos de desenvolvimento que privilegiam o mesquinho interesse privado em detrimento do interesse público.
Parece que os meninos e meninas da escola da Comenda ficaram sem o transporte que os levava ao local onde almoçam, para de seguida os transportar de volta à sala de aula.
Dizem-me que a coisa foi feita à moda do Texas. Disparar primeiro e perguntar depois. Ou seja, decidir que a meia centena de crianças passava a ir a pé, acompanhada por funcionárias da escola e PSP, e só depois justificar perante os pais a opção tomada.
Toda esta confusão poderia ter sido evitada se a autarquia propusesse aos pais uma “parceria” para a resolução do problema, antes de os colocar perante o facto consumado.
Bastava seguir o exemplo da “parceria” para a realização da Feira da Caça e da Pesca ou do jogo de basquetebol feminino realizado na Praça de Touros. A autarquia continuava a garantir o custo do transporte e os pais contribuiriam com a presença dos filhos na sala de aula. Claro que a notícia da continuação da garantia do transporte das 50 crianças não teria nem um décimo do impacto da publicidade à volta dos eventos que referi.
É uma questão de valorização de uns parceiros em detrimento de outros.
Por fim… a cultura da exigência. Deixem dizer-vos que são, de todas as palavras da moda, aquelas que mais motivam a minha adesão.
É preciso sermos cada vez mais exigentes connosco e com os outros. Exijamos a nós próprios o respeito que nos é devido. Se temos horário de trabalho, devemos cumpri-lo rigorosamente. Nada de facilitar e ficar dentro da empresa depois do horário contratualizado com a entidade patronal, roubando tempo e espaço à família, ao lazer e à intervenção cívica.
Nada de abdicar de direitos legalmente consagrados, numa atitude de “facilitismo” e “laxismo” (mais duas palavrinhas da moda), que só revelam um enorme desrespeito pelos valores da exigência e do rigor.
Sejamos exigentes, aproveitemos todas as “janelas de oportunidade” para a defesa de direitos ameaçados e, acima de tudo, tenhamos consciência que nem todos os parceiros são dignos de alinharem nas nossas “parcerias”.

Até para a semana

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