Crónica de 11 de Abril de Hélder Rebocho
Quinta, 12 Abril 2007
O fenómeno da violência nas escolas, sobretudo aquela que é exercida pelos alunos sobre os professores chegou a Portugal. Com uns anos de atraso em relação a outros países, é verdade, mas chegou com proporções alarmantes.
Nos últimos anos este tipo de violência tem varrido estabelecimentos de ensino a toda a latitude, desde pais que agridem professores do ensino primário ou pré-primário, até alunos do ensino secundário que exercem pelos seus próprios meios violências físicas ou psicológicas sobre professores.
Esta realidade é demasiado preocupante para continuar a ser tratada com paninhos quentes, porque põe a nú a ausência de valores, a falta de educação e revela uma tendência para o recurso à coacção como forma de dirimir conflitos ou fazer prevalecer posições pessoais. Assume-se, portanto, como um verdadeiro problema social.
Se o fenómeno, no caso dos país ou dos alunos do ensino secundário que agridem professores está muitas vezes associado a quadros familiares precários com evidente crise de valores, em que a violência gera violência e onde a educação e a cultura não têm lugar, já é pouco provável que o mesmo suceda no ensino superior, porque pressupõe-se que um aluno que atingiu este patamar da sua formação não será oriundo de famílias ou meios sociais com debilidades estruturais ou se o é não terá aqui chegado sem solucionar as deficiências geradas pelas suas origens.
É certo que formação não é sinónimo de educação, mas há valores que a formação torna ou deveria tornar mais fáceis de interiorizar.
Por tudo isto tenho muita dificuldade em entender a situação de que tem sido vítima um Professoro do Departamento de Geociências da Universidade de Évora, que há três anos é perseguido e agredido física e psicologicamente na sua pessoa e até dos seus familiares, por um aluno desta Universidade.
Se a atitude do aluno é incompreensível e inadmissível, o que dizer então da postura adoptada pelos responsáveis da Universidade de Évora, que perante uma gravíssima agressão à integridade física e psicológica de um professor por parte de um aluno em virtude do exercício da sua profissão, têm permitido o arrastar da situação durante anos, deixando o professor à mercê do aluno, que pasme-se, continua a frequentar a Universidade como se nada tivesse acontecido.
Os inquéritos abertos por este estabelecimento foram todos arquivados por falta de provas, no entanto todos os processos judiciais onde os mesmos factos foram sujeitos a apreciação têm conduzido à condenação e à acusação do aluno, precisamente por existirem provas suficientes das violências denunciadas, ou seja, as instâncias judiciais têm chegado onde a Universidade de Évora ainda não chegou, embora os factos sejam os mesmos.
O certo é que enquanto os Tribunais vão ultimando os julgamentos e a Universidade arquivando inquéritos por falta de provas, o professor em causa é obrigado a viver em clima de terror e a assistir ao desmoronar da sua carreira profissional e académica, afinal o investimento de mais de vinte anos de estudo e investigação, tudo perante alguma passividade daqueles que deveriam ser os primeiros a sair em sua defesa.
Em pouco mais de vinte anos o ensino em Portugal mudou, massificou-se, transformou-se numa nova realidade, arrastando consigo problemas para os quais o país não estava e parece ainda não estar preparado.
O caso em apreço não é uma manifestação de indisciplina, mas de violência, o que é bem diferente e dada a sua gravidade e proporções merecia uma reacção mais enérgica, não só da parte dos responsáveis pela Universidade de Évora, mas do próprio Ministério da Educação, sob pena de se estar, por omissão, a contribuir para a banalização destes comportamentos e a abrir a porta à sua entrada na rotina social.
Coisas sérias - Eduardo Luciano
Quinta, 12 Abril 2007
Ontem, foi o último dia de trabalho da deputada Odete Santos na Assembleia da República.
Durante mais de duas décadas, a deputada comunista prestou um inestimável contributo com as suas intervenções e propostas para agitar a modorra cinzenta de um parlamento em que a maioria dos deputados estão de acordo quanto ao essencial das políticas adoptadas pelos diversos governos.
Mais do que isso, foi sempre, com seu estilo questionável mas inconfundível, a imagem da autenticidade que sobressaía dos discursos preparados, em que não se diz o que se pensa e muitas vez nem se pensa o que se diz.
Podem não gostar da imagem, podem achar exagerados os seus tiques facilmente caricaturáveis, podem entender que a sua participação em programas de televisão de gosto duvidoso não deveria ter acontecido, mas uma coisa terão de reconhecer: a sua genuinidade.
Reconhecida pelo seu próprio nome, sem a excrescência do título académico a acompanhar, a Odete contraria a conversa da treta dos que dizem que os políticos são todos iguais, que estão lá para se “amanharem”, que entram pobres e saem ricos.
A Odete, sempre entendeu o exercício do mandato de deputada como uma tarefa partidária, em nome de uma opção política e ideológica que sempre assumiu sem tibiezas.
Por isso, na hora de mudar de tarefa não se questionou sobre o que iria fazer a seguir, assumiu aquilo que todos os candidatos do seu partido assumem quando se candidatam, de que o mandato está sempre é disposição do partido.
Mas Odete Santos não se retira, nem se reforma, nem desiste, nem muda de lado, nem adequa o discurso ao gosto do ouvinte. Provavelmente terá mais tempo para se dedicar ao teatro e a outras actividades de que abdicou pelo exercício da função de deputada, mas aposto que vamos continuar a vê-la a dar voz pelas suas causas de sempre.
É normal e desejável a renovação das bancadas parlamentares e não há insubstituíveis, mas espero sinceramente que o jovem que irá ocupar o lugar de Odete Santos seja capaz desse exercício fantástico que é manter a verticalidade e a coerência para continuar a mostrar aos analistas de mesa de café e politólogos de meia viagem de táxi, que os políticos não são todos iguais nem se movem todos por obscuros interesses pessoais.
O exercício da função política, na sua acepção mais nobre, não deve ser entendido como uma carreira profissional, preenchida por um grupo de cidadãos metidos num saco com o rótulo de classe política, onde cabem todos, independentemente das suas opções.
Sei que algumas pessoas que me ouvem estariam à espera de uma crónica sobre o assunto do momento: as dúvidas quanto à legitimidade do uso de um título académico, pelo primeiro-ministro.
Lamento tê-las desiludido, mas hoje preferi falar de coisas sérias e de outra gente.
Até para a semana
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