quarta-feira, 15 de novembro de 2006

A POESIA NO ALANDRO AL

Fim

Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!

Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
Eu quero por força ir de burro.

Mário de Sá-Carneiro (1890-1916)

Meia verdade é como habitar meio quarto
Ganhar meio salário
Como só ter direito
A metade da vida

O demagogo diz a verdade a metade
E o resto joga com habilidade
Porque pensa que o povo só pensa metade
Porque pensa que o povo não percebe nem sabe

A verdade não é uma especialidade
Para especializados clérigos letrados

Não basta gritar povo é preciso expor
Partir do olhar da mão e da razão
Partir da limpidez do elementar

Como quem parte do sol do mar do ar
Como quem parte da terra onde os homens estão
Para construir o canto do terrestre
- Sob o ausente olhar silente de atenção –
Para construir a festa do terrestre
Na nudez de alegria que nos veste

Sophia de Mello Breyner Andressen

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