Finanças Locais
Eduardo Luciano
Quinta, 12 Outubro 2006
Começaram ontem a ser discutidas, na Assembleia da República, as diversas propostas de alteração à Lei das Finanças Locais.
Esta discussão foi precedida, nas últimas semanas, por uma intensa barragem de títulos e notícias sobre as finanças locais, a solidariedade devida pelas autarquias no combate ao deficit, tudo bem misturado com algumas suspeições sobre as actividades de alguns autarcas (ou caricaturas de autarcas). O ambiente que se pretendia criar propiciava a colocar no banco dos réus da opinião pública, o conjunto do poder local.
A discussão que deveria ser esclarecedora acabou por não o ser. Confundindo-se, propositadamente, conceitos como transferências de meios, penalizações por excesso de endividamento, despesismo ou má gestão de recursos. Tudo para que parecesse óbvia a necessidade de reduzir os meios financeiros das autarquias locais.
É preciso esclarecer que o regime das finanças locais visa a justa repartição dos recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias. Não se trata, portanto, de uma qualquer benesse que o governante de serviço possa atribuir ou deixar de atribuir.
As propostas de alterações à Lei 4/98, apresentadas e defendidas pelo partido do governo, visam fundamentalmente reduzir os meios financeiros na disponibilidade das autarquias e dessa forma atacar a autonomia do poder local democrático.
Rapidamente, todos os autarcas de norte a sul e de todos os quadrantes políticos se aperceberam do que estava nas intenções da proposta do governo. Fizeram contas e verificaram que do cruzamento das novas competências que têm vindo a ser transferidas da administração central para a administração local, com a diminuição meios financeiros a transferir, resultava um claro ataque à autonomia e capacidade de intervenção das autarquias que dirigem.
Neste processo vimos alguns autarcas do partido do governo a fazerem verdadeiros exercícios contorcionismo, aparecendo enquanto presidentes de câmara a contestar a proposta de lei e enquanto militantes do PS a defender a necessidade da sua aplicação.
O assunto é sério. No nosso distrito, segundo as contas da AMDE, os municípios perderão, a prazo, qualquer coisa como quase sete milhões de euros, sendo que alguns destes perderão 25% da sua capacidade financeira.
Considerando a importância do trabalho das autarquias locais, na criação de condições de vida dignas para as suas populações e a necessidade de satisfação de um outro patamar de exigências de desenvolvimento local, as alterações à lei das finanças locais deveriam ir exactamente no sentido oposto. No sentido do reforço das transferências para as autarquias locais e do aperfeiçoamento dos mecanismos redistributivos da lei.
Outra alteração que me parece urgente é a garantia da estabilidade da aplicação da Lei. Ninguém planeia com eficácia sem a estabilidade das regras a aplicar.
Provavelmente, usando o poder da sua maioria absoluta e a conivência dos partidos à sua direita, o PS irá aprovar estas alterações.
Teremos menos autonomia local, menos capacidade de investimento e intervenção. Teremos certamente menos democracia.
E por falar em democracia, o poder judicial continua a decidir sobre os processos relacionados com as eleições para a RTE.
No passado dia 9 o Tribunal decidiu dar provimento à providência cautelar interposta pelo presidente da RTE e suspender a eficácia do despacho do Secretário de Estado do Turismo que impunha a realização de novas eleições.
Tudo normal. Tudo como se esperava. Com uma excepção. Não vi publicada na primeira página do jornal local nenhuma notícia sobre o assunto. E impunha-se que assim fosse. Com o mesmo relevo com que foi publicada a notícia do despacho do Senhor Secretário de Estado.
Pode ser que ainda saia.
Até para a semana
Sem comentários:
Enviar um comentário