terça-feira, 11 de julho de 2017

CRONICA DE OPINIÃO TRANSMITIDA HOJE PELA DIANA/FM

CLÁUDIA SOUSA PEREIRA
                               DA INSUSTENTÁVEL LIGEIREZA DO SER
Parece que a mulher de um presidente dos EUA, não a actual e jovem Melânia mas a senhora Eleanor Roosevelt, teria sido autora de uma afirmação sobre mulheres de que muito gosto. Terá dito que as mulheres são como as saquetas de chá e que só quando metidas em água quente revelam o quão fortes são. Gosto, sobretudo, porque substituiria bem, hoje em dia, mulher por ser humano e a frase continuaria igualmente rica de significado. Ora, a autora parece não ter sido Eleanor, tratar-se-ia antes de um ditado irlandês de meados do século XIX, e que terá sido outra primeira-dama norte-americana, Hillary Clinton, quem lha atribuiu nos anos 90, sabe-se lá já com que intenções de valorizar a importância das “consortes” da República. Seja como for, é conversa equívoca como uma bela metáfora, esta comparação que não estará isenta de tresleituras mas está certamente pejada de boas imagens.
Nesta época em que tantos e tantas vão a banhos, normalmente procurando águas cálidas, a imagem aparentemente frívola e discriminatória, ainda que cheia de delicadeza, leva-me a encerrar este ano de crónicas com um tema que, mais do que acentuar uma geral questão de género, trata a necessidade do ser para além do parecer. Curiosamente, a ligação deste par ser/parecer é muito colada, quase universalmente e ao longo da História, ao género feminino, até por quem luta militantemente nas questões feministas. Afirmo-o com à-vontade, pela convivência que tenho com uma geração que, nascida e criada em ambiente não discriminatório de género, não perde o seu tempo, na sua maioria, com essa necessidade constante de distinção e afirmação de género, o que bem pode agradecer às gerações anteriores.
A frase traz-me o gosto no desgosto das generalizações tendenciosas. Ou seja, generalizarmos quando nos dá jeito e reclamarmos o “cada caso é um caso” quando…nos dá jeito, também. Enfim, padrões e padronizações de que nenhum de nós está isento nos vários gestos do dia-a-dia e que só na casmurrice ganham contornos de ridículo. A casmurrice é, aliás, recorrente em vários graus e esferas. “Casmurrice” aqui entendida literalmente como obstinação, já “esfera” considerada figuradamente como extensão da autoridade ou poder, dos talentos ou das atribuições.
A generalização da placidez feminina desgosta-me tanto como a generalização do profissionalismo, da capacidade de mobilização, da determinação (que pode confundir-se sempre com a dita casmurrice) ou da competência, todos atribuídos a elementos dessa esfera, aqui no outro sentido literal para além do sólido geométrico, onde a esfera se perfila ao lado do pilar, que é a condição de ser mulher. Ou mãe, ou esposa ou o que quer que seja que tem, no correspondente outro género, igual valor distintivo para o que quer que seja. Enfim, o que é possível encontrar numa mente aberta, que olha o futuro de frente e não com os olhos na nuca, sempre com medo de quem está à volta ou atrás e possa vir reclamar também a sua participação nesse futuro.
Gosto de poder ser comparada, ao lado dos homens, mulheres e transgéneros, todos sem transtornos de identidade que façam do género o argumento mais forte que arrasta, como velhas latas atadas entre si por um cordel, qualquer outra qualidade ou característica assexuada e muito mais valiosa; gosto de ser comparada com um delicado saquinho de chá, capaz de revelar todo o seu esplendor quando tem de ser. “Capaz” é uma palavra sem género e é por isso que eu gosto de me rodear dos que são capazes. E qualquer ser humano (generalizo) é tão capaz, por ser ser e ser humano, de despertar em nós admiração com destacadas boas características muito suas (individualizo) em que demonstra, quase de forma natural e inconsciente, o que de melhor tem para dar. Essas são o que dão sentido à Vida. Pelo menos à minha! Boas férias e até breve.



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