Terça, 19
Abril 201
Agora que estão apaziguados
os ânimos daquelas figuras mais ou menos públicas a quem deu para prometer uns
tabefes virtuais ou fazer queixinhas do chefe, online e urbi
et orbi, parece-me que voltar ao tema da comunicação social em modo
democrático é uma matéria que se impõe a quem se ocupa de dinâmicas sociais e
educa, a vários níveis, para a cidadania.
O Facebook®, para além de um imenso negócio proporcionado por milhões e que
enriquece poucos, é uma aparentemente simpática rede social que permite, na era
das tecnologias ao serviço de (quase) todos, manterem-se as pessoas em contacto
e comunicarem. Passámos muito depressa de uma sociedade em que se dizia que os
valores individualistas também se deviam à falta de comunicação entre as
pessoas, para uma sociedade em que a toda a hora podemos estar a comunicar os
pormenores mais íntimos com todos, ou com aqueles com quem escolhemos criar uma
rede. Não tenho dúvidas que, por exemplo, muitos de nós que a utilizamos já por
lá reencontrámos amigos de infância, de juventude ou de trabalho que a vida se
encarregou de afastar, e que temos podido acompanhá-los com som e imagem ou
desabafos, nos momentos que queiramos partilhar uns com os outros.
O que se passa, então,
é que para nessas comunidades que criamos acabarmos por ter as companhias que
merecemos isso dá-nos o trabalho de termos de filtrar, sem estratégias de
censura de má memória, aqueles com quem não nos apetece conviver, nem virtualmente.
Isto não quer dizer que não haja quem use precisamente esses métodos, em versão
caseira da espionagem, e crie os chamados perfis falsos para, simulando dar a
cara, “sacar” informações sem o fazer. E “sacar” informações já é quase só uma
brincadeira de meninos, porque há quem o faça para achincalhar, difamar, enfim
perturbar e influenciar os ainda crédulos ou, pronto, mais preguiçosinhos (e
sim, penso nos jornalistas que se dão a pouco trabalho de investigação e se
limitam a ser megafones daquilo que têm disponível numa rede social, apesar de
poucochinho e obviamente longe da imparcialidade da informação que uma boa
notícia tem). E os mais crédulos, o chamado público em geral, tendem tantas
vezes a julgar que “onde há fumo há fogo”, e muitos utilizam os sinais de fumo
para levar a sua avante ou trazer a água ao seu moinho. Uma prática muito pop,
para usar uma simpática abreviatura aplicada a comportamentos de grandes
colectivos ou massas.
As atitudes, mais
chocantes para uns do que para outros, que se têm em perfis ditos públicos, ou
seja abertos a todos, são por definição alargados para fora do nosso círculo de
amigos e todos os cuidados, quer connosco quer com os outros, devem ser por
isso muito levados em conta. E como em tudo, há que conhecer e reconhecer as
circunstâncias em que as grandes declarações escancaradas ou os innuendos mais
matreiros são expostos nestas novas plataformas de comunicação por indivíduos
às massas. E os indivíduos que as produzem, sem osmedia a tratar do
assunto para o bem e para o mal, devem saber, e muitos até sabem, reconhecer-se
como principal alvo de avaliação dos outros, para além da vontade que têm que
os que os leiam avaliem aqueles de quem dizem coisas.
É também por isso que quando conhecemos as pessoas, porque fazemos
efectivamente parte da sua rede social ou porque já lhes conseguimos tirar a
pinta, muito do que vamos lendo não nos ofende, choca ou espanta. A alguns até
podemos elogiar como coerentes, com ou sem ironia. Nada, no entanto, colide com
o facto de que, quando se assumem diferentes cargos e ser nesses cargos que
somos avaliados por outros em público, ser também assim que, em público,
devemos perceber que representamos muito mais do que aquilo que somos,
tornando-nos um exemplo alargado, ou seja uma parte que qualifica um todo. O
nosso autor dá um conselho, não aos que sabem exactamente o que estão a fazer e
querem continuar, mas aos que pensam que se pode dizer tudo, ou talvez nem
pensem que aquilo que dizem é o que acaba por defini-los. Diz o Vergilio Ferreira:
«Uma forma de o medíocre convencido imitar a grandeza é não dizer mal de
ninguém.» O espaço público, digo eu, seria muito mais seguro e sério, mas
também muito menos divertido. Até para a semana.
Cláudia Sousa Pereira
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