quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015


                                                       Igreja de São Mateus


De acordo com o Inventário Artístico de Portugal a Igreja de São Mateus fica situada a cerca de 5 km da sede do concelho, para a banda meridional com presença assinalada por dois pequenos e rústicos cruzeiros de pedra.
         Antiquíssima, já existia no ano de 1210, data em que foi doada à metrópole eborense pelo deão Fernando de Agosto e confirmada em 1211 pelo bispo D. Soeiro II.
         Graças ao saudoso Padre Alberto Dias Barbosa, foi completamente restaurada em 1971. De frontaria voltada para o lado do ocidente, é uma discreta obra clássica de alvenaria escaiolada de azul e branco de caio, sem qualquer vestígios da primitiva fábrica, assente em adro murado, com escadaria no corpo principal, do vulgarizado tipo rural alentejano. Portada simples, de granito emoldurado, sobrepujada por guarnição de volutas com enrolamento, em estuque de relevo, datado de 1753, e tímpano da mesma classe, sóbrio e discreto, centrado por pequena cruz marmórea assente em base de esculturas cranianas. Na ilharga norte, ao mesmo nível da empena, levanta-se o campanário, composto por sino de bronze fundido, onde existe legenda esculpida, numa só linha, sotoposta a delicada cruz engalanada:
SOV DE SAM MATEOS TERMO DE MONTEMOR
                                            ANNO DE 1804
         Ainda, na fachada axial, subsiste um azulejo setecentista das Almas do Purgatório.

A nave

         O corpo da nave, relativamente baixo, não é defendido, como é hábito nos templetes rurais, por confrafortes. A caixa do presbitério é igualmente, de construção de alvenaria, de secção quadrangular mas ainda do século XVI, recoberta, no beiral, por friso denticulado, alvo de cal e de telhado de linhas radiadas terminado por moderna lanterneta.
         O interior (com assoalhado de 1896) é distribuído por capela-mor e nave, ambas de planta rectangular e de notória simpleza de adornos. Dos fundamentos não conserva senão a estrutura arquitectónica: a nave, com tecto de meio canhão, tem alçados revestidos de obra de tinta-de-água imitando marmoreado.
         Nos lados colaterais, junto da boca da capela-mor, levantam-se dois oratórios porticados, assentes em moderna armação de colunel de madeira pintada, da invocação seguinte:
         Evangelho – Altar de Nossa Senhora do Rosário, com imagem de roca, revestida e coevas. O oratório é do tipo corrente de vidraça com baldaquino, mas o corpo retabular está composto por talha em colunata da ordem coríntia e de espaços lavrados com lambrequins, arabescos e aves simbólicos, dourados. Banqueta com castiçais de latão, do estilo joanino e crucifixo de madeira popular (séc. XVIII).
         Este altar teve confraria própria eclesiástica e culto intenso na área, conservando-se, dos tempos antigos, alguns objectos culturais valiosos, que se guardam na actual sede da freguesia de Nossa Senhora da Vila, de Montemor-o-Novo e a seguir se descrevem. Teve, também, as esculturas de S. João Batista e de S. Brás.
         O altar das Almas, na banda da Epístola, também do tipo oratório, assenta em composição de talha dourada e marmoreada, com alçados laterais apilastrados, contendo, no nicho, S. Miguel, escultura de madeira colorida e em mísulas dispostas em dois andares, inferiormente, Santo António e S. Sebastião, e ao alto, S. Brás e S. Pedro, todas de feição populista e de madeira policromada (sécs XVII-XVIII).
         O púlpito, de lenho, com balaústres torneados, repousa em base de pedra caiada de branco, de forma piramidal, com ornatos muito singelos

Presbitério
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         De planta quadrangular, é recoberto por cúpula de meia laranja, assente em trompas, de prospectos totalmente revestidos de apainelados geométricos, de tinta-de-água, sem merecimento pictural. De arco-mestre redondo, apilastrado, tem altar-mor de alvenaria, porticado, da ordem coríntia, setecentista. A imagem titular – S. MATEUS – sem o anjo, que se perdeu, é de madeira bem estofada, coetânea.
         O Baptistério, de plenta quadrada e cúpula redonda assente em trompas, está, ao presente, revestido de obra de escaiola, moderna: pia marmórea, de secção cilíndrica lisa. Conserva antigo diptico de pintura a óleo sobre pinho de Flandres, actualmente disposto em dois painéis soltos. Obra populista oficinal eborense do ciclo maneirista da primeira fase, tem algum interesse artístico e representa: S. João Evangelista e S. João Batista (c.ª de 1560). Medem, cada alt. 1,38 x larg. 0,60 m, incluindo o emolduramento, que está compreendido nas pranchas.
         Quase sobranceiro, na face Epístola, existe outra capela, dedicada ao Senhor Jesus dos Passos, inaugurada em data posterior a 1758, aberta por arco redondo e vão interno revestido de pinturas de escaioladas e esponjados. Tecto de penetrações e altar de alvenaria, muito singelo. É pequenina e de planta quadrangular.
         A imagem padroeira, vulgar, possui rico resplendor de prata branca, típico de fins do séc. XVIII. Na sacristia, subsiste pitoresco e popular retábulo de tábua, pintado ao longo, figurado pelas Almas do Purgatório.
         Das alfaias religiosas do templete, recomendam-se, pelo seu interesse artístico, as seguintes:
         “Cruz Processional”, de latão amarelo, de pontas quadrifoliadas encerrando as imagens dos quatro evangelistas (peça gótica de fins do século XV?).
         “Cruz Processional”, de prata branca, com pontas esculpidas no gosto barroco ornadas de anjos. Punções de Évora e marcas de ourives FXC (Francisco Xavier Calado – cª de 1765).
         “Cálice”, de prata branca, base circular, decorada por arabescos insculpidos, geometrizantes e encadeados (cª de 1860). Alt. 0,22 cm.
         “Píxide”, de prata, ornado por elementos florais. Estilo neoclássico. Punções do Porto. Ourives M C (fins do século XVIII). Alt. 0,22 cm.
         “Naveta”, de prata, exemplar representativo da arte naval portuguesa de meados do séc. XVII, fortemente lavrado no gosto barroco com flores, arbustos e vieiras. Comp. 0,20 cm.
         “Turíbulo” de prata esculpida e secção esférica, com base lobulada e cúpula transfurada recoberta de quadrifólios. Influência oriental (séc. XVII). Peça rara. Alt. 0,20 cm’
         “Custódia”, de latão prateado e resplendor dourado: estilo neoclássico. Alvores do séc. XIX (de pouca valia artística).
         “Vara de Juiz da Confraria de S. Pedro”, de prata lisa, com tímpano esculpido pela Tiara do titular (séc, XVIII).
         Dimensões da igreja: nave – comp. 14,70 x 5,25 m; capela-mor – fundo 4,95 x  larg. 4,60 m.
        
Marco romano

         Próximo de S. Mateus, existiu um padrão que servia de marco miliário, feito no tempo do Imperador António, com a seguinte inscrição: “deste lugar a Évora, são 12 000 passos”. Em 1933, esteve exposta no desaparecido Museu Municipal, na Sala Fernão de Mascarenhas, uma fotografia deste marco romano.

Fiscalização feita à Igreja de São Mateus em 1534

         “Aos vinte e seis dias do mês de Outubro de mil quinhentos e trinta e quatro visitou Manuel Dórdio visitador neste Bispado de Évora, a capela curada de São Mateus, no termo da vila de Montemor-o-Novo. A visita decorreu na companhia do Cura da dita Capela e de alguns fregueses dela. Achou-a bem servida no espiritual; e quanto ao temporal, por serviço de Deus mandou o seguinte: “Primeiramente, mandou aos fregueses da dita Capela (os moradores da freguesia) que arranjem para ela um cálice de marco e meio a dois marcos de prata (cerca de 350 a 500 gramas de peso).
         Do mesmo modo mandarão fazer no cruzeiro umas boas grades com seu ferrolho e fechadura e revolverão toda a Igreja de maneira que não chova nela. Tudo isto cumprirão até à primeira Visitação (que for feita a esta Igreja) sob pena de (multa de dois mil réis.
         E havendo alguns fregueses que não queiram pagar para as sobreditas coisas, mandou ao Cura que não diga Missa com eles e os faça ir à Matriz de Montemor sob pena de excomunhão, e por cada domingo ou festa que lá não forem pagará cada um duzentos réis. As penas serão para a Chancelaria de Sua Alteza”.
        
Memórias paroquiais

         Na Memória Paroquial de São Mateus (ANTT, Memórias Paroquiais, vol.23, n.º 85, pp. 573 a 574), em Maio de 1758 o padre da paróquia deixou um interessante registo, do qual recolhi a seguinte informação:
         A paróquia possui quinhentas e quarenta e cinco pessoas, a igreja está situada numa campina que dista meia légua da vila de Montemor-o-Novo e dela se vê somente o Castelo da dita vila. O orago desta igreja é o Apóstolo São Mateus. Tem três altares, o altar maior tem a imagem de São Mateus, e tem mais a imagem de São Miguel, e a de São Sebastião. O outro altar é de Nossa Senhora do Rosário, e tem a sua imagem, e a de São João Batista, e a de São Brás. O outro altar é de Santo António, e tem a sua imagem, a de São Pedro, de Santo Amaro e a de São Gregório. A igreja é de uma nave e tem duas irmandades – a das Almas e de Nossa Senhora do Rosário, e ambas são eclesiásticas. O pároco desta igreja é cura e tem de renda quatro moios, treze alqueires de trigo e quatro alqueires de cevada. Tem esta freguesia um convento de Santa Cruz de Rio Mourinho, que é dos religiosos de São Paulo, tem esta freguesia duas ermidas, uma é a de São Luís, na qual no dia do Santo se faz grande festa, com muito concurso de gente; a outra ermida é a de Santa Margarida na qual se fazem duas festas no ano, uma no dia da santa e a outra é no segundo Domingo de Setembro, a Nossa Senhora da Oliveira, na qual está a sua imagem. Conta esta freguesia de herdades que dão pão, e vinhas e pomares que dão frutos de todas as castas, e é do que vivem estes moradores. Dista esta freguesia cinco léguas da cidade de Évora, e dista quinze léguas da cidade de Lisboa.
         E não há nesta freguesia coisa mais alguma notável, do que o referido, por ser campo.
         S. Mateus, 29 de Maio de 1758
         Deste seu muito humilde súbdito
         O Padre André da Mana Vidigal
         Após a aprovação do Código Civil de 1936, S. Mateus, foi uma das dez freguesias do nosso concelho a serem extintas.


Fevereiro/2015
 Augusto Mesquita

Transcrito da "Folha de Montemor" com a devida autorização do Autor





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