quinta-feira, 7 de outubro de 2010

CRÓNICA DE OPINIÃO DA RÁDIO DIANA/FM

Transcrição da crónica diária transmitida aos microfones da :http://www.dianafm.com/

Eduardo Luciano - Comemorações


Quinta, 07 Outubro 2010 10:42
O cinco de Outubro teve este ano razões adicionais para ser festejado. Os números redondos prestam-se a festejos alargados e quando se chega aos três dígitos a festa é sempre de arromba.
Participei em dois eventos de cariz diferente. Um almoço na SOIR Joaquim António de Aguiar e uma sessão extraordinária da Assembleia Municipal.
No almoço foram recordados os momentos fundadores da I República, a importância de sociedades como a Joaquim António para a divulgação dos ideais republicanos, no período que antecedeu o fim da monarquia, e o seu papel na intervenção ao nível da instrução.
Num Portugal com 75% de analfabetos, bem sabiam os pais das sociedades de instrução que o acesso à literacia era um factor essencial para combater o obscurantismo e um elemento fundamental para a construção de uma sociedade de cidadãos, por oposição a uma sociedade de súbditos de uma qualquer majestade.
Foram recordados os almoços e jantares comemorativos da implantação da República realizados durante os 48 anos de ditadura, onde se davam vivas à República, ao povo português e "àquilo que a gente sabe" mas que não se podia dizer.
Foram mais de cem os convidados da SOIR, que assistiram a intervenções de carácter pedagógico, pela capacidade dos oradores de nos envolverem nas experiências do passado.
Mas também houve a ponte feita com o futuro através da intervenção do jovem presidente do grupo cénico que lembrou as condições de vida do início do século XX, naturalmente diferentes das deste início de século, não deixando de apontar a coincidência de, cem anos depois, serem os mesmos extractos sociais a sofrerem na pele as consequências das crises com o intensificar da exploração.
Para aquele jovem de pouco mais de vinte anos a república tem que ser uma coisa diferente ou, se quiserem, uma república de novo tipo.
Depois lá parti para a Assembleia Municipal onde se adivinhava uma coisa mais solene, cheia de palavras de circunstância, redondinhas para ninguém se ferir.
Aí tivemos de tudo e quase tudo teve o seu cabimento na efeméride. As intervenções da CDU e BE a lembrarem que a I República, apesar do avanço civilizacional que constituiu, traiu os seus ideais, alienou a base de apoio popular, perseguiu ferozmente os sindicatos, assassinou operários e não teve pejo em reprimir brutalmente os que lutavam por melhores condições de vida.
Tivemos uma surpreendente intervenção do representante do PSD em defesa de sua Alteza Real, com uma passagem pelas propostas neo-liberais da liderança do seu Partido e um ataque às opções do orçamento municipal que, por mero acaso, foi aprovado pelos votos do PS e do PSD.
Mas mais surpreendente foi a intervenção da bancada do PS, com direito a suporte em Power Point. Frases soltas, um recado de sua Alteza Real, perdão, do ministro Santos Silva, seguido de qualquer coisa ininteligível sobre educação, que como se sabe o governo elegeu para tema do dia, seguidos de longos minutos de fotos a passar no ecrã, acompanhadas de uma música mais ou menos Zen.
Estarão a pensar que seriam imagens alusivas à revolução de 1910, puro engano. Eram fotografias de diversos eventos com a participação dos eleitos locais do PS, naquilo que mais parecia uma acção de campanha eleitoral deslocada no tempo.
Escolher a comemoração dos cem anos da República para fazer um exercício de auto elogio a uma governação local e nacional, numa sessão solene de uma Assembleia Municipal, até poderia ser uma provocação. Mas de facto nem isso conseguiu ser. Foi apenas um momento parecido com aquelas secas que os nossos amigos nos dão, quando nos obrigam a ver as fotos das últimas férias. Bem andaram aqueles que, de todas as bancadas, aproveitaram para passar pelas brasas.
Felizmente que o ridículo não mata, detestaria ver alguém fulminado numa comemoração tão importante.
Até para a semana
Eduardo Luciano

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