Transcrição da crónica diária transmitida aos microfones da :http://www.dianafm.com/
Quando a esperança é inútil - Francisco Costa
terça-feira, 13 Novembro 2007
A recente guerra de África relembra aos portugueses que não há as guerras boas.
Apesar das 3 décadas que nos separam desse tempo, só agora começamos a enfrentar esse período sem os excessos pascalianos da razão e da sua exclusão.
A Guerra de África foi mesmo assunto tabu dentro de muitas famílias que sofreram directa ou indirectamente com ela, sobretudo as pejorativamente classificadas de “retornadas”.
Tal facto não me impediu, enquanto criança, de escutar entre familiares, algumas histórias que enquadravam esta ou aquela situação aflitiva e que por pouco não significou a morte.
Contava um familiar que se fazia acompanhar sempre do que depreendi serem três cartões de identificação política: um da UNITA, outro do MPLA e um terceiro da FNLA. E assim foi vendo facilitada a sua mobilidade independentemente das circunstâncias ou das zonas onde se movimentava.
Noutra situação contava-se que teria ficado toda a família junta, durante dias, abrigada em casa e sob ataques cruzados dos diversos grupos armados que operavam na região. Tudo isto quando já Portugal tinha retirado o último soldado de Angola (em Julho de 75) e os portugueses que ainda restavam (o caso da minha família) estavam por sua conta e risco.
Sabem todos o que é a violência banalizada e a ausência de ordem.
Obrigados a abandonar o País muitos portugueses foram concentrados em campos de refugiados, principalmente na África do Sul. Nesse campo cumprimentavam-se entre si com um: Isso vai? A expressão que substituía o bom-dia, a boa tarde ou a boa-noite parecia indicar que era inútil ter esperança que as coisa voltassem a ser o que tinham sido.
Quando Portugal se envolveu indirectamente no conflito no Iraque perguntei-me porquê?
Depois de conhecer minimamente os pressupostos da real politik internacional e das dúvidas generalizadas acerca da existência de armas de destruição massiva no Iraque não consegui aceitar o nosso papel naquilo que é um desastre ocidental.
No meio da destruição diária os iraquianos cumprimentam-se com um “Chako mako?”, que significa mais ou menos “Isso vai ou não vai?”.
Maad Fayad, jornalista de um jornal conhecido como o diário internacional dos árabes, fez a pergunta ritual a um viajante que lhe responde: Vai indo: carros armadilhados, atentados suicidas, tiros, cadáveres, inflação…
O mesmo viajante mostrou a Fayad 3 bilhetes de identidade: um com conotação cristã, um xiita e outro sunita… É difícil não ver o caso com familiaridade.
Os iraquianos parecem concluir que a esperança é inútil. E por isso não vivem, sobrevivem.
Portugal tem responsabilidades políticas no que se passa no Iraque. E é cada vez mais difícil aceitar que nos calemos devido a compromissos internacionais assumidos anteriormente.
Terminariam as mortes no Iraque acaso assumíssemos o erro?
De certeza que não, mas era um sinal do nosso grau de civilidade e um passo que daríamos na afirmação de uma nação não agressora.
Sem querer cometer o excesso de excluir a Razão ou de admitir apenas a Razão digo que os ideais podem estar acima das diferenças políticas, de raça ou de credo. E que é preciso assumi-los.
Afinal a esperança não pode ser inútil.
Obrigado e até para a semana.
Francisco Costa
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